domingo, 1 de novembro de 2009

Trabalho Final de Sociologia Contemporânea – Bourdieu X Giddens

    Os autores Pierre Bourdieu e Anthony Giddens, que terão suas opiniões colocadas neste trabalho e relacionados ao problema da globalização, cultura e multiculturalismo, tentaram sintetizar o subjetivismo e o objetivismo.
    O questionamento de Bourdieu começa quando ele percebe que as pessoas não respeitavam as estruturas (mesmo achando que na teoria do estruturalismo faltava uma teoria da ação, que foi “deixada de lado” por seu formulador Lévi-Strauss – Lefort. “A troca e a luta dos homens”), isso porque a vida real não é organizada de modo que é difícil seguir essas estruturas. A forma estrutural tem influência da lingüística (estudos feitos por Saussure), onde a fala é a manipulação superficial da linguagem, do mesmo modo, as estruturas não são apenas usadas pelas pessoas mas também são manipuladas conscientemente por elas. Para Bourdieu a estrutura e a sociedade são como uma língua, todas têm uma estrutura por trás que permitem sua utilização e representação. Ele diz que as estruturas são internalizadas nas pessoas, sendo a consciência individual um produto das estruturas. Para Bourdieu as coisas são sentidas enquanto para Giddens as pessoas sabem um pouco mais o que fazem (reflexividade – monitoramento: as pessoas pensam no que fazem).
    Giddens diz que as pessoas precisam de rotina para se sentirem seguras no mundo, pois a rotina tem a vantagem  de as pessoas não precisarem pensar no que irão fazer. Para ele tudo consiste em relações face-a-face que estão relacionadas entre si, sendo que quando se altera uma parte todas as outras são influenciadas, daí sua idéia de sistemas, onde a reprodução dos sistemas sociais nem sempre ocorre, pois não é funcionalista, não se tem facilidade de mudar as coisas. Do mesmo modo que para Bourdieu as estruturas estando internalizadas nas pessoas, faz com seja mais difícil ocorrer mudanças nas rotinas, é necessário que as pessoas usem as estruturas e assim reproduzam essas estruturas, essa utilização facilita o dia-a-dia.
    Bourdieu inaugura a teoria do habitus, que é uma estrutura externalizada, que consiste em disposições e esquemas de percepção, pensamento e ação, o habitus gera o sentido comum e uma certa arte de improvisação e sentido prático. O habitus é um sistema subjetivo mas não é individual das estruturas interiorizadas. A teoria de habitus parte do princípio que cada pessoa é moldada e se caracteriza socialmente. O habitus abrange a apreensão, o pensamento e as ações que são esquematizados dentro da formação social. Bourdieu dá o nome de esquemas de disposição, que podem ser interpretados como um sentido de orientação, que ajuda a pessoa a guiar-se nos diversos campos sociais. Esta teoria está em forte oposição com as idéias do homem livre, que decide e age livremente. O habitus é transmitido desde o nascimento através da socialização, isto é, depende fortemente da posição social e das condições gerais de vida da família. O habitus é incorporizado e torna-se algo evidente e “natural”. A relação entre habitus e campo social é muito estreita, uma vez que as estruturas incorporadas pelos indivíduos das diversas classes diferem bastante.
    Entretanto, Bourdieu fala de algo que está em toda parte e é ignorado: o poder simbólico, que é um “poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo o exercem" (O poder simbólico – p.8).
    Segundo ele, a análise estrutural seria capaz de analisar a apreensão de cada uma das "formas simbólicas", a partir do isolamento da estrutura imanente a cada produção simbólica, privilegiando as estruturas estruturadas (usando a lingüística saussuriana). A eficácia dos sistemas só é possível, porque eles próprios são estruturados. O poder simbólico constrói uma realidade.
    As relações de comunicação são, para Bourdieu, relações de poder determinadas pelo poder material ou simbólico acumulado pelos agentes envolvidos nas relações. Os "sistemas simbólicos" atuam como instrumentos estruturados e estruturantes de comunicação e conhecimento e asseguram a dominação de uma classe sobre outra a partir de instrumentos de imposição da legitimação, "domesticando" os dominados. Os "sistemas simbólicos" são produzidos e apropriados pelo próprio grupo, ou por um corpo de especialistas que conduz à retirada dos instrumentos de produção simbólica dos membros do grupo.
    As ideologias, segundo Bourdieu, são determinadas pelos interesses de classe e pelos interesses específicos daqueles que a produzem e pela lógica específica do campo de produção.
    A globalização envolve, entre outras coisas, um pouco de tudo isso: ideologia, “fim” das interações entre as pessoas (face-a-face), imposição de sistemas simbólicos de um grupo em outro, tendo como conseqüência a homegeinização da cultura, pois há uma “domesticação” dos dominados, como foi dito acima. Há também muitas mudanças no habitus das sociedades, pois todos começam a agir e pensar do mesmo modo e gostar das mesmas coisas, deixando seu habitus “para trás”.
    O multiculturalismo é um fenômeno mundial de transformações sociais e conseqüência de vários sintomas de origens raciais, migratórias e principalmente do questionamento por uma cultura mais justa e politicamente correta. O mundo pós-guerra buscando fugir do monoculturalismo, reivindica uma abertura igualitária e conquistas de fronteiras em grande escala no que diz respeito ao desenvolvimento de estudos, lingüística e artes. No Brasil na maioria das vezes o multiculturalismo foi discurso de reivindicações das minorias tidas como militância, que idealizavam uma sociedade que respeitasse as diferenças e não fosse necessariamente homogênea. No entanto, o governo e boa parte da sociedade não conseguiram aceitar tais diferenças e segregaram tais ideologias julgando um perigo à unidade nacional e à identidade do país.
    É inegável a pluralidade das identidades em via da globalização e devido a conquistas relativamente recentes que provocam hoje uma nova estética da política econômica e sociocultural do país, sustentando um aparente reconhecimento de direitos e colhendo os frutos da abertura multicultural. Porém a diversidade cultural é ainda desafio para a educação da língua, literatura e outros aspectos culturais. O fenômeno da globalização não significou o ir e vir de todas as idéias permitindo aos cidadãos uma realidade verdadeiramente igualitária para vivência de fronteiras em diferentes áreas, manifestações culturais e artísticas. Compreender a arte como parte da cultura é o mesmo que entender a cultura como algo intrínseco ao ser humano. Aquilo que nos distingue de outros animais. Somos diferentes pelas culturas onde nascemos, países em que vivemos. Somos iguais pela nossa determinação em sermos nós mesmos. Porém, devemos ver o mundo com os olhos alheios e não com os nossos. Segundo a globalização, é proibido nos vermos em nossa própria arte. Para nos sentirmos bem, e estar na “moda”, temos que assistir a filmes que roubam nossa subjetividade e massacram nossas culturas nacionais e locais.
    Bourdieu fala do cuidado que se deve ter ao aplicar idéias oriundas de um dado contexto cultural a outros, apontando para as suas implicações: riscos de ingenuidade e simplificação, além de inconvenientes. Bourdieu é defensor do movimento antiglobalização, para ele as relações de força entre os agentes sociais apresenta-se sempre na forma transfigurada de relações de sentido.
    A globalização decide o que e a quem importar, sufocando a espontaneidade e opondo-se a idéia de um mundo sem fronteiras, concentrando-se apenas no entusiasmo do comércio, na aquisição de tecnologia e grandes negócios. A globalização deseja e exige o lucro em todas as suas atividades. Impõe a uniformização do seres humanos onde todos devem ser iguais, vestir igual, comer hambúrguer etc., impõe também normas de comportamentos, valores morais, ideologias e gosto estético. É importante para a globalização do lucro destruir as culturas nacionais, bem como as culturas locais, ou seja, dizimá-las a qualquer custo. Ao destruir nossas culturas, destroem as nossas identidades. Isola-se o indivíduo para que ele perca sua individualidade, isso contrapõem a idéia de Giddens sobre tudo estar baseado nas relações face-a-face, mesmo este autor não sendo contra a globalização.
    Os que dizem estarem globalizando o mundo, socorrendo os países emergentes, tirando-os das crises e adaptando-os ao seu sistema monetário internacional, estão intensificando problemas já existentes como a pobreza.
    Um dos principais alvos de crítica de Bourdieu, foram os meios de comunicação, que estariam, segundo ele, cada vez mais submetidos a uma lógica comercial inimiga da palavra, da verdade e dos significados reais da vida. Para ele “esse poder simbólico que, na grande maioria das sociedades, era distinto do poder político ou econômico, hoje está concentrado nas mãos das mesmas pessoas que detêm o controle dos grandes grupos de comunicação, quer dizer, que controlam o conjunto dos instrumentos de produção e de difusão dos bens culturais."
    Bourdieu era um crítico da globalização financeira. Recusava a escolha entre a mundialização concebida como “submissão às leis do comércio” e a defesa das culturas nacionais ou de qualquer forma de nacionalismo ou localismo cultural. A ‘nova’ teoria de classes define a classe não só pela sua posição econômica, mas igualmente pelo seu consumo cultural. É o acesso à cultura e o dispor de capital cultural que estratifica uma sociedade. O capital cultural tem uma função central para a compreensão de estratégias de reprodução social das classes.
    No entanto, Giddens acredita que o Brasil está progredindo na tentativa de equilibrar o bem estar social com a evolução econômica, e que o país está deixando para trás o fantasma do passado, criando uma economia estável, competitiva num âmbito mundial. Para Giddens “todos os governos hoje em dia estão tentando encontrar uma relação diferente com a economia. Nos velhos tempos, os governos tentavam controlar as empresas diretamente. Agora, de maneira geral eles não fazem mais isso e o papel do governo é promover o investimento em pessoas, em infra-estrutura, em desenvolvimento e tecnologia”.  "Os governos dão as condições sociais para permitir o desenvolvimento de uma economia competitiva. Ainda existe um papel importante para o governo mas não é o mesmo e isso freqüentemente implica em mudanças na natureza do governo e do Estado porque em muitos países, inclusive no Brasil, o Estado se torna grande demais e burocrático".
    Para Giddens, o ideal seria os estados caminharem pelo meio, tentando equilibrar o estado que busca o sucesso econômico a todo custo com o estado que investe no bem estar social. No entanto, reconhece que o caminho para alcançar esse objetivo é complicado, e é mais fácil aplicar a terceira via em países do primeiro mundo.
    Para ele o que o Brasil pode fazer, "é aprender com os problemas e estratégias desenvolvidas em países com sistema assistencial para evitar alguns dos problemas e garantir que tenha um sistema previdenciário mais ativo e não passivo”. Para ele o impacto da globalização econômica, no caso da América Latina, a colaboração entre os países maiores do Cone Sul é crucial na promoção do desenvolvimento econômico e na proteção da democracia. Para ele os debates sobre o futuro do Mercosul são respostas apropriadas à globalização.
    É claro que as idéias podem ajudar a entrever saídas para grandes problemas de ordem mundial, e que existe o aspecto surpreendente de sociedades distantes e isoladas se tornarem próximas e acessíveis, mas é preciso prever onde terminam as influências positivas e onde começam as intervenções na própria identidade cultural, para que possamos dialogar contradições e termos nossa própria forma de enxergar e dizer o mundo.

Bibliografia:
     BOURDIEU, P. “Esboço de uma teoria da prática”, trad. Paula Montero. In Sociologia, org. por Renato Ortiz. São Paulo: Editora Ática, 1994 (1972)
     BOURDIEU, P. 1990 (1987), “Espaço social e poder simbólico”, In Pierre Bourdieu, Coisas ditas, trad. Cássia R. da Silveira e Denise Moreno Pegorim. São Paulo: Editora Brasiliense
     GIDDENS, A. A constituição da sociedade, trad. Por Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 1989 (1984)
     LEFORT, C. “A troca e a luta dos homens”. In: As formas da história. São Paulo: Brasiliense, 1979
     www.terra.com.br – pesquisa: globalização, multiculturalismo e cultura
     www.terra.com.br – História – por Voltaire Schilling
     Jornal do Estudante – www.sociologia.hpg.ig.com.br
     Entrevista dada por Giddens ao De Olho no Mundo,  terça-feira, dia 29/07/2002
     Marco Weissheimer - O legado crítico de Pierre Bourdieu
     Caros Amigos – ano IV, número 38, maio 2000, Editora Casa Amarela, pag. 20 – “Globalitarismo e cultura” 

Trabalho Final de Sociologia Contemporânea – ano 2002

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