sábado, 27 de junho de 2009

Os fundamentos do Positivismo e o advento da Sociologia

Introdução
    Para introduzir o pensamento filosófico do trabalho, começamos pelo pensamento de Hegel, que era considerado como a “filosofia negativa”, e como este foi “deixado” de lado introduzindo-se a “filosofia positiva”. Depois uma breve comparação entre a filosofia positiva e a filosofia negativa, comparando alguns autores. E mais adiante mostramos os pensamentos e influências de alguns dos principais autores que eram positivistas, e  como surge em meio disso tudo a sociologia.  

Hegel - a Idéia, a Natureza, o Espírito
    Os três grandes momentos hegelianos no devir dialético da realidade são a idéia, a natureza, o espírito. A idéia constitui o princípio inteligível da realidade; a natureza é a exteriorização da idéia no espaço e no tempo; o espírito é o retorno da idéia para si mesma. A primeira grande fase no absoluto devir do espírito é representada pela idéia, que, por sua vez, se desenvolve interiormente em um processo dialético, segundo o sólito esquema triádico (tese, antítese, síntese), cujo complexo é objeto da lógica; a saber, a idéia é o sistema dos conceitos puros, que representam os esquemas do mundo natural e do espiritual. É, portanto, anterior a estes, mas apenas logicamente.
    Chegada ao fim de seu desenvolvimento abstrato, a idéia torna-se natureza, passa da fase em si à fase fora de si; esta fase representa a grande antítese à grande tese, que é precisamente a idéia. Em a natureza a idéia perde como que a sua pureza lógica, mas em compensação adquire uma concretidade que antes não tinha. A idéia, todavia, também na ordem da natureza, deveria desenvolver-se mais ou menos, segundo o processo dialético, das formas ínfimas do mundo físico até às formas mais perfeitas da vida orgânica. Esta hierarquia dinâmica é estudada, no seu complexo, pela filosofia da natureza.
    Finalmente, tendo a natureza esgotado a sua fecundidade, a idéia, assim concretizada, volta para si, toma consciência se si no espírito, que é precisamente a idéia por si: a grande síntese dos opostos (idéia e natureza), a qual é estudada em seus desenvolvimentos pela filosofia do espírito. O espírito desenvolve-se através dos momentos dialéticos de subjetivo (indivíduo), objetivo (sociedade), absoluto (Deus); este último se desenvolve, por sua vez, em arte (expressão do absoluto na intuição estética), religião (expressão do absoluto na representação mítica), filosofia (expressão conceptual, lógica, plena do absoluto).
    Com o espírito subjetivo, a individualidade empírica, nasce a consciência do mundo. O espírito subjetivo compreende três graus dialéticos: consciência, autoconsciência e razão; com esta última é atingida a consciência da unidade do eu e do não-eu.
    O espírito subjetivo é estudado, em sentido vasto, pela psicologia, que se divide em antropologia, fenomenologia do espírito, psicologia propriamente dita. Não estando, pois, o espírito individual em condição de alcançar, no seu isolamento, os fins do espírito, de realizar a plena consciência e liberdade do espírito, surge e se afirma a fase do espírito objetivo, isto é, a sociedade.
    No espírito objetivo, nas concretizações da sociedade, Hegel distingue ainda três graus dialéticos: o direito (que reconhece a personalidade em cada homem, mas pode regular apenas a conduta externa dos homens); a moralidade (que subordina interiormente o espírito humano à lei do dever); a eticidade ou moralidade social (que atribui uma finalidade concreta à ação moral, e se determina hierarquicamente na família, na sociedade civil, no estado).
    A sociedade do estado transcende a sociedade familiar bem como a sociedade civil, que é um conjunto de interesses econômicos e se diferencia em classes e corporações. O estado transcende estas sociedades, não porque seja um instrumento mais perfeito para a realização dos fins materiais e espirituais da pessoa humana (a qual unicamente tem realidade metafísica); mas porque, segundo Hegel, tem ele mesmo uma realidade metafísica, um valor ético superior ao valor particular e privado das sociedades precedentes, devido precisamente à sua maior universalidade e amplitude, isto é, é uma superior objetivação do espírito, segundo a metafísica monista-imanentista de Hegel, daí derivando uma concepção ético-humanista do estado, denominada por Hegel espírito vivente, razão encarnada, deus terreno.
    Segundo a dialética hegeliana, naturalmente a sucessão e o predomínio dos vários estados na história da humanidade são necessários, racionais e progressivos; e necessária, racional e progressiva é a luta, a guerra, graças à qual, ao predomínio de um estado se segue o predomínio de um outro, a um povo eleito sucede um outro. Este, no fundo, tem razão sobre o vencido unicamente porque é vencedor, e aquele tem culpa unicamente porque é vencido. A história do mundo - com todo o mal, as injustiças, os crimes de que está cheia - seria destarte o tribunal do mundo. (O que se compreende, quando se faz coincidir o "ser" com o "deve ser", como acontece de fato no sistema hegeliano, graças à dialética dos opostos, em que os valores são nivelados, porquanto igualmente necessários para a realização da idéia).
    Se bem que no sistema hegeliano a vida do espírito culmine efetivamente no estado, põe dialeticamente acima do espírito objetivo o espírito absoluto, em que, através de uma última hierarquia ternária de graus (arte, religião, filosofia), o espírito realizaria finalmente a consciência plena da sua infinidade, da sua natureza divina, em uma plena adequação consigo mesmo.
    Na arte o espírito tem intuição, em um objeto sensível, da sua essência absoluta; quer dizer, o belo é a idéia concretizada sensivelmente. Portanto, no momento estético, o infinito é visto como finito. Na religião, pelo contrário, se efetua a unidade do finito e do infinito, imanente no primeiro; mas em forma sentimental, imaginativa, mítica. Hegel traça uma classificação das religiões, que não passa de uma história das mesmas, segundo o seu sólito método dialético. Nessa classificação das religiões o cristianismo é colocado no vértice como religião absoluta, enquanto no ministério da encarnação do Verbo, da humanação de Deus, ele vê, ao contrário, a consciência que o espírito (humano) adquire da sua natureza divina.
    Acima da religião e do cristianismo está a filosofia, que tem o mesmo conteúdo da religião, mas em forma racional, lógica, conceptual. Na filosofia o espírito se torna inteiramente autotransparente, autoconsciente, conquista a sua absoluta liberdade, infinidade. Como as várias religiões representam um processo dialético para a religião absoluta, assim, os diversos sistemas filosóficos, que se encontram na história da filosofia, representariam os momentos necessários para o advento da filosofia absoluta, que seria o idealismo absoluto de Hegel.

Filosofia Positiva e Filosofia Negativa
    Na década que se seguiu à morte de Hegel, o pensamento europeu entrou numa Era de “positivismo”, anunciando-se como o sistema da Filosofia Positiva. Pode-se citar importantes autores positivistas, como: Comte (filosofia positiva do Estado), Stahl (representante do positivismo na filosofia do Direito), Schelling (visava ao que era realmente efetivo e existente), entre outros, que poderão ser citados durante o texto.
    A filosofia positiva de Schelling é muito diferente da de Comte, para este, “positivo” são os fatos comuns da observação, enquanto Schelling acentua que a experiência não é limitada aos fatos dos sentidos externo e interno. Comte está orientado para a ciência física e para as leis necessárias  que governavam a realidade, Schelling procurava expor uma “filosofia da liberdade” e afirma que a atividade criadora livre é o último dado da experiência.
    A filosofia positiva era uma reação consciente contra as tendências críticas e destrutivas dos racionalismos francês e alemão. Por suas tendências críticas, o sistema hegeliano fora designado como uma “filosofia negativa”. A filosofia de Hegel repudiava qualquer realidade irracional e irracionalizável. Este tipo de filosofia nega ao dado a dignidade do real; ela contém o “princípio da revolução”. A afirmação de Hegel de que o real é racional foram compreendida como se apenas o racional fosse real.
    A filosofia positiva empreendia seu contra-ataque ao racionalismo crítico em duas frentes: Comte lutava contra a forma francesa de filosofia negativa (Descartes e o Iluminismo), e Schelling e Stahl, lutavam na Alemanha contra o sistema de Hegel. Este duplo ataque da filosofia positiva é o que caracteriza a história do pensamento pós-hegeliano.
    A filosofia positiva visava a neutralizar o processo crítico implicado na “negação” filosófica do dado, e a restituir aos fatos a dignidade do positivismo. O método positivista certamente destruiu muitas ilusões teológicas e metafísicas e promoveu a marcha do pensamento livre, assim o positivismo pretendia ser a integração do conhecimento humano.
    O positivismo veio facilitar a sujeição do pensamento a qualquer coisa que existisse e que manifestasse o poder de durar na experiência. A filosofia positiva levava à confirmação da ordem existente contra aqueles que afirmam a necessidade da sua “negação”.
    A Teoria Social moderna recebeu do positivismo seu maior estímulo durante o século XIX. A Sociologia originária deste positivismo e da sua influência desenvolveu-se numa ciência empírica independente.

Saint-Simon
    Como Hegel, afirmava que a ordem social engendrada pela Revolução Francesa demonstrava que a humanidade havia atingido seu estágio adulto e também estava convencido de que esta nova ordem continha a conciliação da idéia com a realidade; contra Hegel, ele descrevia este estágio adulto em termos econômicos, o processo industrial era o único fator de integração da nova ordem social. O progresso das condições econômicas exige que a filosofia se transforme em teoria social, e a teoria social é a mesma coisa que a economia política ou “a ciência da produção”.
    De início, Saint-Simon se contentou em proclamar os princípios do liberalismo radical, e também teve uma visão otimista da sociedade industrial. A nova ordem industrial era acima de tudo uma ordem positiva, que representava a afirmação e a satisfação de todos os esforços humanos em favor de uma vida feliz e abastada. Não era necessário superar o dado; a filosofia e a teoria social só precisavam de compreender e organizar os fatos. A verdade devia ser derivada dos fatos e só deles. Saint-Simon tornou-se, portanto, o fundador do positivismo moderno.
    Hegel chegara ao ponto em que a sociedade, que representava o estágio histórico do autodesenvolvimento dos homens, tinha de ser interpretada como a totalidade das relações humanas. Era esta interpretação filosófica da teoria social que tornava a liberdade uma teoria crítica da economia política. 
    A filosofia de Saint-Simon se desenvolveu justamente na direção oposta a de Hegel. Ela começou com a reconciliação da idéia com a realidade e acabou por considerá-las inconciliáveis. Sua doutrina reflete as convulsões sociais causadas pelo progresso da industrialização sob a Restauração.
    Algum tempo após Saint-Simon “inaugurar” o positivismo, a teoria social elaborava esta refutação radical da ordem social pela qual ele havia justificado sua nova filosofia. O sistema industrial passou a ser considerado o sistema da exploração capitalista. A doutrina do equilíbrio harmonioso foi substituída pela doutrina da crise inerente. O progresso econômico não significava necessariamente o progresso humano. A filosofia social recorreu ao dogma do progresso e abdicou da economia política como fundamento da teoria social.

A Filosofia Positiva da Sociedade – Auguste Comte
    Comte foi o responsável pela separação da teoria social com a filosofia negativa e colocou-a sob a ótica do positivismo. Fez da sociedade objeto de uma ciência independente, a sociologia, pois agora renunciava ao ponto de vista transcendente da crítica filosófica e tornava-se um complexo mais ou menos definido de fatos, governados por leis mais ou menos gerais.
    A filosofia positiva de Comte é uma contradição in adjecto. Ela refere-se a uma síntese de todo conhecimento empírico ordenado em um sistema de progresso harmonioso, seguindo um curso insensível. As  oposições às realidades sociais são subtraídas à discussão filosófica.
    Em Comte, a nova sociologia deve estar ligada aos fatos da ordem social vigente. Ele não nega que esta necessite de correção e aperfeiçoamento, mas exclui as possibilidades de se tentar negar ou superar esta ordem. Em conceito, o interesse da sociologia positiva é sua justificativa e apologética.
    Entretanto nem todos os movimentos positivistas foram assim. Durante o século XVIII o positivismo foi revolucionário. Era um ataque direto às concepções religiosas e metafísicas, que constituíam o suporte ideológico do Antigo Regime. Já os positivistas do Iluminismo, não visavam uma ciência bem ordenada e sim uma prática social e política, que provasse a prática humana em comparação à um padrão de verdade transcendental à ordem social que não existia como um fato, mas como meta. Para estes iluministas a “sociedade ideal” não resultava de fatos existentes, mas de uma análise filosófica da situação histórica e revelada a eles sob a forma de sistema social e político opressivo. A razão poderia dominar o mundo e os homens poderiam transformar suas “vidas obsoletas” se agissem baseados no conhecimento e capacidade desta razão.
    A filosofia positiva de Comte é uma defesa ideológica da sociedade de classe média e o embrião da justificação filosófica do autoritarismo. O resultado deste positivismo veio a ser um sistema religioso com o culto de símbolos, nomes e sinais de maneira requintada.
    O positivismo rejeitava o idealismo, isto é, substituiu pouco a pouco, a livre espontaneidade do pensamento por funções predominante receptivas. Para os idealistas a razão estava ligada a idéia de liberdade e opunha-se a toda concepção de uma necessidade natural imposta à sociedade. Já a filosofia positiva tendia a igualar o estudo da sociedade ao estudo da natureza, tornando a ciência natural arquétipo da teoria social, ou seja, a sociedade era concebida como governada por leis racionais que funcionavam com a necessidade natural.
    Comte submeteu a teoria social ao princípio do “espírito autêntico” do positivismo, dogma geral da invariabilidade das leis físicas, como forma de libertá-la da teologia e da metafísica, emprestando-lhe a situação de uma ciência. O repúdio positivista da metafísica foi, assim, associado ao repúdio da exigência do homem de alterar e reorganizar suas instituições sociais de acordo com a sua vontade racional.
    Comte também encarregara à sociologia de assegurar este ensinamento como um meio de estabelecer “os limites gerais de toda ação positiva”. A política “positiva” que defende, tende por sua natureza a consolidar a ordem pública.
    Na sua propaganda pró-positivismo visa declarar que a ciência genuína não tem outro fim geral que o de “estabelecer e fortificar” constantemente a ordem intelectual que é base indispensável de toda ordem verdadeira. A ordem na ciência e na sociedade fundem-se num todo indistinto e sua meta é justificar e fortificar esta ordem social. A política positivista tenta desviar de si os olhos da opinião pública, concentrando assim de forma primeira, todo esforço social em uma “renovação moral”. O positivismo está interessado em ajudar a transformar a agitação política em cruzada filosófica em que os homens percebem que sua ordem social está assentada em leis eternas que ninguém pode transgredir sem punição e segundo estas leis toda forma de governo é transitória, o que torna a Revolução sem sentido.
    Percebe-se que o positivismo de Comte legitima a consolidação do poder nas mãos da classe dominante e defende esta classe das incursões anarquistas. Sua filosofia visa a organização e não a distribuição, e por isso jamais fará uma negação absoluta. As leis que a ciência positiva descobrira eram diferentes do empirismo e positivismo no sentido em que afirmam a ordem estabelecida como base para a negação da necessidade de construção de uma nova ordem. Há uma idéia progressista, que está presente nos mecanismos da ordem estabelecida sendo que esta progride suavemente sem ter de ser destruída.
    O positivismo pretende sistematizar a totalidade das as idéias, tem uma idéia de ordem muito forte e a sociologia positivista é uma “estática social”, pois considera que há uma harmonia verdadeira e permanente entre as diversas condições de existências de sociedade. Esta teoria positivista de autoridade tem em vista uma sociedade que baseia toda sua atividade no consentimento da vontade dos indivíduos e essa submissão a uma autoridade absoluta fornece o grau máximo de segurança.
    A sociologia de Comte é um misto de estática e dinâmica social. Tenta conciliar a ordem e o progresso, para completar a satisfação comum da exigência de ordem e progresso, o programa positivista de reformas sociais perfigura a passagem do liberalismo ao autoritarismo, pois as leis necessárias do progresso não excluem os esforços práticos em direção a uma reforma social que removesse quaisquer obstáculos que estivessem no caminho daquelas leis.
    Portanto percebe-se que o sistema de Comte conserva a função libertadora da filosofia ocidental, porque tende a transpor o abismo que separa os indivíduos isolados e a uni-los em um universo real. A sociedade é uma universalidade presente na obra de Comte. “Ela” funciona como um palco único, no qual o homem desempenha sua vida histórica, e além desta, como o único objeto da teoria social. O indivíduo acaba por ser completamente absorvido nesta sociologia, não tem representatividade singular e o Estado é um mero subproduto de leis implacáveis que governam o progresso social.
    A teoria positiva da sociedade não vê razão para confinar o desenvolvimento humano aos limites dos estados nacionais soberanos. Sua concepção de ordem universal é fundamentada pela união de todos os indivíduos na humanidade e a destruição positivista dos padrões teológicos e metafísicos obsoletos atinge o clímax no reconhecimento da humanidade não como estado, mas como universo real, isto é realidade única. Seria a única entidade digna de reverência.

A Filosofia Positiva do Estado: Friedrich Julius Stahl
    Na França, a filosofia positiva afirmava que o curso da História humana pressionava no sentido da subordinação final de todas as relações sociais aos interesses da indústria e da ciência, com isto significando que o Estado seria lentamente absorvido por uma sociedade que tivesse abraçado a Terra.
    Em contraste com sua forma na França, a filosofia positiva na Alemanha era de espécie inteiramente diferente. Enquanto na Inglaterra e na França o feudalismo fora inteiramente destruído por uma classe média poderosa e rica, concentrada nas grandes cidades, e particularmente na capital, a nobreza feudal na Alemanha conservava grande parte dos seus antigos privilégios.
    A Restauração fortalecera o absolutismo e este triunfou, seguido da transformação completa do quadro cultural:
•    irracionalismo teístico
•    idéia cristã do Estado
    A Universidade de Berlim deixara de ser de Hegel e dos hegelianos, e tornava-se a universidade dos filósofos da Revolução, como Stahl.
    O sistema hegeliano, que considerava o Estado e a sociedade como uma totalidade “negativa”, e que sujeitava ambos ao processo histórico da razão, não mais podia ser aprovado como a filosofia oficial. Para o novo governo nada poderia ser mais suspeito do que a razão e a liberdade. Ele precisava de  um princípio positivo de justificação, que protegesse o Estado das forças rebeldes que o defendesse, com mais vigor do que o faria Hegel, das violentas investidas da sociedade.
    A reação positivista que surgiu na Alemanha foi, estritamente, uma filosofia do estado, não da sociedade.
    A significação da filosofia de Stahl se encontra precisamente na adaptação do autoritarismo anti-racionalista ao desenvolvimento social da classe média. Ele era anti-liberal, contudo não falava somente em nome do passado feudal, mas também em nome daquele futuro histórico em que a própria classe média se tornaria anti-liberal.
    Seu inimigo não era a classe média mas a Revolução que ameaçava esta classe,  ao mesmo tempo que ameaçava a nobreza e o estado monárquico. Seu anti-racionalismo servia à causa de uma aristocracia dominante que se atravessava no caminho do progresso racional; e servia também ao interesse de todo domínio que não se pudesse justificar com fundamentos racionais.
    Ele condenava o racionalismo moderno como a matriz da revolução; tal filosofia, dizia ele, significava para o domínio da interioridade da religião o que a revolução significava para o domínio externo, político, isto é, o afastamento do homem de Deus.
    Já que o racionalismo tinha recebido sua expressão mais representativa em Hegel, o ataque de Stahl concentrou-se contra ele.
    Stahl considerava que a mais perigosa concretização do racionalismo era a teoria do Direito Natural. Ele a compreendia como investindo o indivíduo com mais direitos, e mais altos, do que aqueles que lhes concedia o direito positivo. Ele opunha, pois, à tese do direito natural a concepção que o direito e o direito positivo são conceitos equivalentes, e à dialética “negativa” ele opunha uma “filosofia positiva” do autoritarismo.
    Ele reprovava a filosofia de Hegel, sua dita inabilidade em explicar os fatos particulares que compunham a ordem da realidade. Sempre preocupado com o universal, Hegel jamais descia dos conteúdos individuais, que eram os verdadeiros conteúdos do dado.
    Stahl incorporou à sua filosofia positiva os princípios das escolas “naturalistas”, com o fim expresso de empregá-los como princípios de justificação.
    Por isso, seu método consiste, essencialmente, em deduzir, da vontade de Deus, por meios diretos e indiretos, toda a ordem social e política. Quando mais vital for o assunto em questão, mais direta é a dedução. A distribuição da riqueza é obra do “decreto divino”. As instituições da sociedade são fundadas sobre a ordenação divina do mundo dos homens. A desigualdade social é vontade de Deus. O estado e seus representantes são uma “instituição divino”, e embora o homem tinha liberdade de viver sob esta ou aquela constituição, não apenas o estado como tal decorre de decreto divino, como também a constituição particular e as autoridades particularidades possuem, por toda parte, sanção divina.

A transformação da Dialética em Sociologia: Lorenz von Stein
    Stein é influenciado pela filosofia de Hegel. Para o desenvolvimento da teoria social sua obra é insignificante, pois ele é considerado um historiador da Revolução Francesa e das teorias sociais da França, e não como um teórico.
    A princípio ele toma a teoria social como “ciência da sociedade” que investiga de modo particular as relações sociais entre os homens e as leis e tendências que nela operam, sendo assim as relações sociais podem se diferenciar das relações físicas, econômicas, políticas ou religiosas, mas jamais ocorrem sem elas.
    A sociologia é relacionada com o estudo geral da sociedade deixando grande número de problemas para o estudo de outras ciências especializadas, por exemplo: o problema da distribuição da riqueza e investimento internacionais, são estudados pela economia, já os problemas sociais podem ser estudados pela ciência política e pela educação; mas, acima de tudo a sociologia está desligada de qualquer ligação com a filosofia.
    Comte é considerado o criador da separação da sociologia da filosofia, dizendo que a sociologia não nega a filosofia no sentido de assumir o conteúdo oculto da filosofia, e de levá-la à teoria e à prática sociais, mas situa-se num domínio apartado da filosofia com circunscridade e verdade próprias.
    Comte e os pensadores desta tradição igualam a teoria social com a filosofia, assim Stuart Mill esboçou sua lógica da ciências sociais dentro de uma lógica geral compreensiva, e Spencer fez os princípios da sociologia uma parte do seu sistema de filosofia sintética. Sendo assim a sociologia torna-se tema de um campo independente de investigação.
    O método sociológico era orientado no sentido de descrever os fatos observados e de estabelecer generalidades empíricas sobre eles, contrastando assim com a dialética, que considerava o mundo como uma totalidade negativa e o método sociológico como intrinsecamente neutro, ou seja, considerava a sociedade da mesma maneira que a física considerava a natureza. Além disso a teoria social dialética considera quais relações sociais abarcavam e condicionavam todas as esferas da existência. Por essas razões a dialética era um método filosófico e não sociológico. O método no qual cada conceito dialético singular continha toda a totalidade negativa e portanto entrava em conflito com qualquer recorte destacado de um domínio especial das relações sociais.
    Qualquer tentativa no campo da sociologia ou teoria que desmentir a pretensão dialética ou teoria que separá-la do seu fundamento filosófico como o fez Stein, que transformou as leis e conceitos dialéticos em leis e conceitos sociológicos, sendo assim Stein considera sua obra a primeira tentativa de construção do conceito de sociedade como um conceito independente e desenvolvido do seu conteúdo.
    Stein presenciou a Revolução Francesa, observou as lutas de classes e os acontecimentos pós revolucionários, a partir deste contexto sua abordagem histórica concreta induziu-o a dizer que o processo econômico era a base do processo social e político, e que a luta de classes era o conteúdo decisivo da sociedade. Mas para conservar a sociologia como uma ciência objetiva teve que renunciar à sua posição diante do antagonismo dentro do processo econômico renegando assim a tentativa de fundamentar a teoria social sobre a economia política.
    Então a sociologia de Stein, agora, defende a harmonia social em face das contradições econômicas e da moral em face das lutas sociais, trabalhando assim com a idéia do antagonismo entre o Estado e a sociedade, considerando a sociedade como a unidade orgânica da vida humana, enquanto condicionada pela distribuição da riqueza, regulada pela organização do trabalho, movida pelo padrão das necessidades e ligada em sucessivas gerações pela família e seu direito, e o Estado como a comunidade de todas as vontades individuais elevadas a uma união pessoal, esta separação entre o Estado e a sociedade foi de grande importância para a evolução da sociologia, porque dispôs o problema efetivo da moderna teoria social.
    De certo, o processo de transformação dos conceitos filosóficos em conceitos sociológicos, acaba por reduzir a existência histórica do homem aos mecanismos inalterados do processo social, e por reservar seu destino e finalidade moral, concebendo que o processo social é uma luta entre o estado e a sociedade, ou como uma luta da classe dominante pelo poder do estado. O princípio do estado é elevar todos os indivíduos à liberdade perfeita; o princípio da sociedade, subjuga alguns indivíduos a outros. A história é na realidade, a renovação constante deste conflito, em níveis diferentes, e o progresso da história ocorre através de mudanças da estrutura social, resultantes deste conflito, estabelecendo as leis naturais dessas mudanças, luta entre as classes sociais para apoderar-se de poder do estado, quando isto é atingido, começa um novo processo, que consiste interesses positivos de atingir o uso do poder do estado pela classe dominante. Acrescentando que são possíveis duas transformações para consolidar em conflito: a reforma política e a revolução, concluindo que todo revolução resulta em um novo conflito de classes e em uma nova forma de sociedade, apoiando assim a reforma política. Enfim, o homem exige a liberdade e quer possuí-la. Então a classe que quer a “revolução”, ascendeu ao poder, interessa trabalhar pela reforma social, com todas as suas forças e com o auxílio do estado e do seu poder.
    Stein transformou, pois, a dialética em um conjunto de leis objetivas que clamam pela reforma social, como solução adequada para todas as contradições e mutalizou os elementos críticos da dialética.

Conclusão
    Hegel foi quem influenciou todos os pensamentos e pensadores da época, alguns estiveram de acordo com seu pensamento, enquanto outros se opuseram a este pensamento. Com essa oposição surgiram outras importantes teorias, formuladas por importantes autores da época (como os citados no texto), e também em face dessa oposição, surgiu a sociologia como ciência.
    O objetivo do texto foi mostrar o pensamento  de Hegel, como ele influenciou os outros pensadores, como se deu o fim do pensamento hegeliano, surgindo assim, o positivismo, e quais são os mais importantes autores positivistas, e suas teorias; e como a partir disto a dialética se “transformou” em sociologia.

Bibliografia

  • Marcuse, Hebert; Razão e Revolução: Hegel e o advento da teoria social; tradução: Marília Barroso, coleção O Mundo Hoje, vol. 28, Rio de Janeiro, 4ª edição; 1988, ed. Paz e Terra.
  • Bobbio, Norberto; Teoria Geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos; org. Michelangelo Bovero; tradução: Daniela Beccaccia Versiani, Rio de Janeiro, ed. Campus; 2000; 5ª tiragem.
  • Hegel – Coleção Os Pensadores
  • www.filosofos.com.br – Filósofos – temas e fóruns sobre autores e assuntos de filosofia
  • www.mundodosfilosofos.com.br – Textos de Hegel

Trabalho de Metodologia das Ciências - ano 2002

quinta-feira, 25 de junho de 2009

Trabalho de Sociologia (2002)

INTRODUÇÃO

A instituição social é algo que data de épocas longínquas, trataremos aqui de duas importantes instituições sociais: a linguagem e os segmentos sociais. Tanto os segmentos sociais quanto a socialização podem ser influenciadas pela globalização, que tem como característica central a instalação de uma mídia planetária cada vez mais poderosa, que mais parece uma determinação social. Esta globalização pode acabar com a individualidade – destruindo os segmentos sociais – e objetivar uma sociedade polarizada.

Assim, relacionaremos instituição social e globalização e os vários fatores que influem e determinam esses acontecimentos, e também sobre como o ser humano é criado, desde o nascimento, na sociedade em que se insere, e como a globalização mudou essas pessoas e seus relacionamentos com outras pessoas e com a sociedade e formaram-se seus conceitos sobre classe social.

DISCUSSÃO

A instituição social é um padrão de controle da conduta individual imposta pela sociedade. É considerada como uma entidade que tem vida própria e é praticamente imutável.

A linguagem humana pode ser definida como uma aptidão ou capacidade que se manifesta por meio de conjuntos organizados, esta por sua vez, é utilizada pela comunidade para a interação social. Do ponto de vista social, a linguagem caracteriza-se por um conjunto de hábitos aprendidos e até difíceis de mudar. Se a língua precisa ser aprendida é porque ela é uma convenção, resultante de um acordo subentendido entre os indivíduos, e adquirida por tradição. Por isso se diz que ela é um determinado tipo de instituição social e, sendo assim, é exterior ao indivíduo que não pode criá-la e nem modificá-la.

A estratificação social também é uma instituição. É ela quem decide – de acordo com as posses de cada indivíduo – o estrato social ao qual ele pertence. O que foge ao controle dessa instituição é a consciência de classe que cada um tem. Ás vezes, o indivíduo se identifica com um determinado estrato social, seja perla identificação intelectual, moral, religiosa ou qualquer outro tipo, que não seja o estrato correspondente ao seu nível financeiro.

O importante para a identificação da classe social na qual cada indivíduo se insere é o status que ele tem, ou seja, a classe está associada também ao poder e prestígio, segundo Elizabeth Both.

Em contrapartida, Octávio Ianni (ver parte de uma entrevista em anexo), com seu olhar marxista sobre a sociedade, pensa as classes sociais dividida em dois pólos distintos: a burguesia, que são os indivíduos globalizados e o proletariado que são os indivíduos não globalizados. “O centro do mundo não é mais voltado só ao indivíduo” (Octávio Ianni, 1995). Isso reflete uma mudança na consciência de classe: que antes dependia das relações de trabalho e depende agora somente dos meios globalizados que influenciam os indivíduos.

A globalização abriu uma diversidade de interpretações de mundo que antes era acessível a poucas pessoas. Preconceitos, sotaques, raças, não são tão importantes na globalização, pois o indivíduo não existe mais, apenas o coletivo. As relações sociais se tornaram mais intensas, porém não são mais interações do tipo face a face. Todos têm acesso aos diferentes tipos de mundo. A globalização aproximou mundos completamente opostos proporcionando um intercâmbio cultural.

Há muito a globalização se tornou algo comum, pois o Ocidente necessitava comercializar com o Oriente, havia também a necessidade de conquista de novos territórios e com isso acontecia a circulação de estrangeiros. Com tudo isso a globalização foi se tornando uma determinação social. É algo que se impõe constantemente aos indivíduos e os que não se submetem sofrem a força das normas e regras dela. Um exemplo disto é Cuba, um país socialista que está sofrendo a força das normas e regras da determinação social – globalizações – através do embargo econômico aplicado lá pelos Estados Unidos.

Do mesmo modo que “a criança é socializada para um mundo específico e uma individualidade determinada (Berger e Berger, 1997) a globalização é ensinada ao indivíduo desde a época em que se criou a necessidade da interação social com novos universos. A globalização nos foi ensinada, ou melhor, imposta assim como a socialização para um mundo específico e a individualidade é como os interesses de cada indivíduo. Essa imposição da globalização sobre a sociedade faz com se perca os valores culturais de uma região e uma homogeneização das características sociais do mundo.

Existem vários tipos de malhas da rede de relacionamentos:

· Estreita: quando o casal, por exemplo, vem de uma mesma comunidade e nunca se mudou de cidade, têm os mesmos amigos a vida toda. Aí há a segregação dos papéis feminino e masculino.

· Frouxa: quando o casal tem várias experiências; amigos diferenciados; mudaram-se de cidade, etc. Aí não há tanta segregação de papéis.

· De transição: Quando a malha estreita vai se tornando frouxa.

De acordo com essas malhas as pessoas têm diferentes visões da sociedade e da vida. As pessoas mais móveis, geograficamente, são mais ambiciosas em relação à ascensão social – por exemplo, os pais de uma malha frouxa não desejam que os filhos continuem no mesmo nível social (geralmente), mas que ascendam. “As pessoas têm necessariamente de fazer uso de suas experiências pessoais para alcançar uma definição sobre a estrutura de classe funcione; e as suas necessidades pessoais e seus desejos entram também nisto. Os conceitos de classe são usados para uma orientação geral na sociedade mais ampla, para posicionar os estranhos e para avaliar as próprias posições, bem como as dos outros” (Elizabeth Both, 1976).

Podemos estabelecer uma ligação entre Octávio Ianni e Elizabeth Both: depende das experiências pessoais a camada social na qual se inserirá o indivíduo. Quanto maior o número de experiências e mais frouxa dor a malha mais perto o indivíduo estará da globalização.

CONCLUSÃO

Nos parece que a globalização de Octávio Ianni é como que uma conseqüência da malha frouxa, ou seja, quanto mais experiências o indivíduo tem mais amplas são suas ambições em relação à ascensão social. De acordo com a quantidade de experiências do indivíduo é que ele próprio estabelece a camada social da qual compartilha valores; e quanto mais experiências, mais perto da globalização ele está e consequentemente, mais próximo da burguesia também (burguesia pensada como classe com mais status).

É praticamente impossível estabelecermos um critério universal para a conceituação das camadas sociais, pois as pessoas discordam profundamente em suas leituras das mesmas.

Enquanto a sociedade – para os indivíduos – é feita de estratificação social, a globalização organiza a sociedade em duas classes bem distintas (visão marxista).

O indivíduo adquire suas experiências através da própria individualidade determinada e também do mundo para o qual ele foi socializado, então a diversidade de critérios para camadas sociais é justificada pelas diferentes leituras das determinações e instituições sociais.

ANEXO

Estes depoimentos foram retirados de um debate entre Octávio Ianni (professor), Lobão (compositor) e Hermano Penna (cineasta), feito pela revista Caros Amigos e encabeçado por José Arbex Jr., com o título “Globalitarismo e cultura”

Aqui vamos colocar apenas os principais depoimentos de Octávio Ianni sobre globalização, que podem se relacionar, confirmando e as vezes contrariando, com a discussão feita.

“No mundo contemporâneo, há uma fabricação intensa e crescente de produtos culturais, das mais diferentes e diversos tipos, como mercadorias. Eles movimentam empresas, organizações, corporações. Como as corporações, em geral, são enraizadas em países que têm poder econômico e que dispõem de tecnologias, eles acabam se impondo no âmbito da produção cultural, inclusive avassalando as produções dos demais países. Os países mais pobres têm uma grande riqueza cultural, mas essa riqueza não pode fazer face à expansão avassaladora da indústria cultural organizada em termos de corporações. É claro que isso está criando um desafio importantíssimo, não só em termos das tradições culturais das diferentes nações, mas em termos de diferentes atividades culturais relativas ao que é a expressão das pessoas. Disso está resultando uma espécie de asfixia das criações culturais de diferentes setores, às vezes de um pequeno grupo, às vezes de uma nacionalidade, freqüentemente de nações. O que estamos vendo é uma espécie de “mcdonaldização”, uma expansão da Disneylândia como espírito da cultura de massa em escala mundial.”

“ De fato, não podemos afirmar que está havendo um processo de homogeneização. Há um predomínio, uma expansão crescente das atividades e produções de mercadorias culturais orquestrada por grandes empresas. Essas maiores empresas estão conseguindo inventar elementos culturais, engendrar produtos culturais. (...) Não há homogeneização, mas há uma expansão crescente daqueles que são mais poderosos na produção e difusão de valores culturais. Com a implicação, primeiro, de que as produções locais, regionais, de nacionalidade, de nações, ficam bloqueadas, impossibilitadas de se expandir, de se manifestar e de dar continuidade à sua potencialidade. E há outro problema: a cultura diz respeito à vida dos povos, dos indivíduos, é o momento essencial da constituição das pessoas. A cultura é a alma das coletividades. A cultura, em geral, é toda uma visão do mundo. Se o povo está impossibilitado de expressar a sua criatividade, as suas tradições, as suas ambições e utopias, não há dúvida que este é um grave problema. (...) ninguém, nenhum indivíduo, nenhum povo jamais é passivo em termos absolutos. Sempre recria, reinterpreta, sempre decodifica em outros termos. O problema é que o que chega, chega poderoso como avalanche, chega orquestrado, e esse é o grande desafio. O monopólio das tecnologias de comunicação, em âmbito global, exercido por uma poucas corporações, remete à famosa frase de McLuhan: os desenvolvimentos dos audiovisuais, das comunicações eletrônicas do mundo contemporâneo, é aí que vai se realizar a batalha decisiva pelas mentes e corações dos povos. E isso é grave. E o domínio dos oligopólios não deixa espaço para a disputa democrática, para a controvérsia, não há aberturas para que haja o exercício de um certo tipo de humanismo. O que existe é sexo e violência, estetização e sensualização das coisas, seja o que for, e nesse sentido temos então o empobrecimento sério da sensibilidade e da percepção das pessoas.”

“(...) Há uma agressiva expansão de produções culturais, essa fabricação enlouquecida de produtos culturais que é um desafio para todo mundo, para todos os povos. Mas cabe esclarecer o seguinte. Primeiro, vivemos sempre, desde os primeiros momentos da história da humanidade, e cada vez mais nos tempos modernos, um processo ou vários processos da maior importância de transculturação, e a transculturação, por princípio, é altamente positiva. A multiplicação de contatos, de diálogos, a absorção e a troca de elementos, isso é da maior importância. È altamente positivo que haja diálogo, intercâmbio, que não haja barreiras às criações culturais dos diferentes povos. O grande problema é que a produção cultural, por exemplo, do cinema brasileiro, literalmente não entra nos Estados Unidos, ou só entra em setores muito restritos. O cinema de outros povos e continentes tem uma possibilidade limitada de entrar na Europa. Os europeus, que estão com problemas com os americanos, também são resistentes às produções de outros povos. É nesse quadro de luta de interesses que se dá o problema de monopolização, de criação de barreiras, e portanto de intercâmbio que não é plural, que não é democrático. Esse é o grande problema: como quebrar esses monopólios, esses exclusivismos que bloqueiam a transculturação.”

“Vivemos num mundo em que a produção de mercadoria é um processo contínuo, crescente e avassalador. O capitalismo é um modo de produção de mercadorias, então estamos diante de uma situação que é realmente difícil: como defender a produção de bens culturais que tenham a ver com certo humanismo, uma certa pluralidade, uma certa inovação, uma certa vanguarda, sem ficar prisioneiro dessa condição que é a de produzir mercadorias? Aí entra o problema de como certas organizações, certos governos, eventualmente partidos, igrejas, podem ou não criar espaços, criar recursos que permitam que a criatividade tenha continuidade sem estar primária e fundamentalmente determinada pela condição de mercadoria.”

BIBLIOGRAFIA

- BERGER, P. e BERGER, B. (1997) – “O que é uma instituição social” e “Socialização: como ser membro de um grupo” in M.M. Forachi e J.S. Martins (orgs.) Sociologia e Sociedade, SP, Livros Técnicos e Científicos Ed.

- OCTAVIO IANNI, Teorias da Globalização, RJ, Civilização Brasileira, 1995. Capítulo (Metáforas da Globalização”

- ELIZABETH BOTH – Famílias e redes sociais, capítulo VI, Normas e Ideologia : conceitos de classe, RJ, Editora Francisco Alves, 1976.

- Dicionário de Ciências Sociais, FGV/MEC, RJ, 1986. Verbetes sobre classe média, classe social, estamento, estratificação e status.

- Dicionário do Pensamento Marxista, Zahar, 1988. Verbetes sobre classe, classe dominante, classe operária, consciência de classe e luta de classe.

- Caros Amigos – ano IV, número 38, maio 2000, Editora Casa Amarela, pag. 20 – “Globalitarismo e cultura”

Trabalho de Introdução à Sociologia – ano 2002

O Kula – Malinowski

    O objeto de estudo de Malinowski é o sistema de comércio, o Kula. Ele cita algumas condições adequadas para o trabalho etnográfico, descritas a seguir.
    O etnógrafo precisa isolar-se de outros brancos e permanecer em contato, o mais íntimo possível com os nativos. É bom estabelecer uma base na residência de um branco, mas deve ser longe o bastante para não se tornar um local de moradia permanente, do qual ele sai, a determinadas horas, para visitar a aldeia.
    Deve-se ficar na aldeia porque há uma grande diferença entre um mergulho esporádico na vida dos nativos e ficar realmente em contato com eles. Para o etnógrafo, significa que ele deixa de ser um elemento perturbador que, com a própria aproximação alterava a vida tribal que pretendia estudar. Viver na aldeia somente com o interesse de acompanhar a vida nativa é como ver a carne e o sangue de sua verdadeira vida, que recobrem o esqueleto das construções abstratas.
    O etnógrafo deve trazer consigo também o maior número de problemas possível e o hábito de formular teorias que possam ser contestadas pelos fatos ou não. Saber enunciar problemas constitui o maior talento de uma mente científica.
    O objetivo básico da pesquisa etnográfica de campo é mostrar nítida e claramente a constituição social e dividir leis e regularidade dos fenômenos naturais do que for irrelevante. O estudo é feito através de perguntas em situações reais e/ou hipotéticas - só assim os nativos conseguem falar sobre o tema proposto. Deve-se observar o comportamento das pessoas porque assim descobre-se o comentário de determinado assunto contido na mente do nativo.
    O Kula é um comércio intertribal entre comunidades num largo anel de ilhas. A troca desses artigos é acompanhada de rituais mágicos, fixados e regulamentados por convenções tradicionais. Os nativos não têm consciência da extensão do Kula. Para eles seu aspecto fundamental é a troca cerimonial de soulava e mwali (colares e braceletes de conchas).
    A posse temporária de algum deles constitui um símbolo da importância e da glória da aldeia, que são puramente ornamentais (recebido como um troféu). Kula é recebido por quem possui poderes obtidos pela magia ou por heranças familiares. Todos os nativos desejam participar do Kula, mas somente alguns o conseguem.
    Kula é um mecanismo sociológico, uma rede de relações sociais de influências culturais ampla, enraizada na tradição destes nativos.
    Os bens de Kula são manipulados ritualmente em alguns dos mais importantes atos da vida nativa, inclusive na morte.

Bibliografia
MALINOWSKI , Bronislaw.
Coleção Grandes Cientistas Sociais, Bronislaw Malinowski, editora Ática, 2000
Introdução : o assunto , o método e o objetivo desta investigação; Aspectos essenciais da instituição Kula (capítulo IV); O significado do Kula (capítulo V) .

Resenha – Introdução à Antropologia – ano 2002

Trabalho final de Indicadores Sociais

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo traçar um perfil sócio-econômico das regiões brasileiras (Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste), mostrando como a taxa de fecundidade varia em cada região e a partir disso explicar os fatores que podem influenciar essa variação da taxa de fecundidade. Nossa hipótese é a de que fatores como escolaridade, renda, urbanização, influenciam na taxa de fecundidade. Para essa análise, iremos utilizar os Indicadores Sociais Mínimos do IBGE e o Censo 2000.

2. INDICADORES SOCIAIS

Os Indicadores Sociais Mínimos tem como um de seus objetivos permitir o acompanhamento estatístico dos programas nacionais de cunho social, recomendados pelas diversas conferências internacionais promovidas pelas Nações Unidas nos últimos anos. O conjunto de indicadores sociais compreende dados gerais sobre distribuição da população por sexo, idade, cor ou raça, sobre população e desenvolvimento, pobreza, emprego e desemprego, educação e condições de vida. Esses Indicadores tem como algumas de suas principais recomendações a de se utilizar tão-somente dados provenientes de fontes estatísticas regulares e confiáveis e a de desagregar os dados por gênero e outros grupos específicos observando sempre, entretanto, as peculiaridades e prioridades nacionais.

Os Indicadores Sócias Mínimos, aqui utilizados, trazem informações atualizadas sobre os aspectos demográficos, anticoncepção, distribuição da população por cor ou raça; informações atualizadas sobre trabalho e rendimento, educação e condições de vida. Na elaboração do sistema foram consideradas as peculiaridades nacionais e a disponibilidade de dados. Estes estão desagregados por região geográfica, visto que o tamanho e a heterogeneidade do país reduzem a representatividade das médias nacionais, e desagregados, também, em alguns casos, por sexo e cor. Os dados são provenientes de pesquisas do IBGE, censitárias (Censo Demográfico e Contagem da População) e por amostra (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, PNAD) e complementados por outras fontes nacionais.

Definições dos Indicadores Sociais[1] usados neste trabalho:

  • Taxa média geométrica de crescimento anual da população à incremento médio anual da população, medido pela expressão i= sendo P(t+n) e P(t) populações correspondentes a duas datas sucessivas, e n o intervalo de tempo entre essas datas, medido em ano e fração de ano.
  • Taxa de urbanização à percentagem da população da área urbana em relação à população total.
  • Taxa de fecundidade total à número médio de filhos que teria uma mulher de uma coorte hipotética (15 e 49 anos de idade) ao final de seu período reprodutivo.
  • Taxa de mortalidade infantil à freqüência com que ocorrem os óbitos infantis (menores de um ano) em uma população, em relação ao número de nascidos vivos em determinado ano civil. Expressa-se para cada mil crianças nascidas vivas.
  • Anos de estudo à período estabelecido em função da série e do grau mais elevado alcançado pela pessoa, considerando a última série concluída com aprovação (Censo Demográfico, PNAD, 1991, 1992,1993 e 1995).
  • Família à conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência, residente na mesma unidade domiciliar, ou pessoa que mora só em uma unidade domiciliar. Entende-se por dependência doméstica a relação estabelecida entre a pessoa de referência e os empregados domésticos e agregados da família, e por normas de convivência as regras estabelecidas para o convívio de pessoas que moram juntas, sem estarem ligadas por laços de parentesco ou dependência doméstica. Consideram-se como famílias conviventes as constituídas de, no mínimo, duas pessoas cada uma, que residam na mesma unidade domiciliar (domicílio particular ou unidade de habitação em domicílio coletivo) (PNAD 1992, 1993, 1995, 1996).
  • Rendimento mensal à soma do rendimento mensal de trabalho com o rendimento proveniente de outras fontes (PNAD, 1990,1992,1993,1995).
  • Rendimento mensal familiar à Soma dos rendimentos mensais dos componentes da família, exclusive os das pessoas cuja condição na família fosse pensionista, empregado doméstico ou parente do empregado doméstico.
  • Trabalho à exercício de: a) ocupação remunerada em dinheiro, produtos, mercadorias ou em benefícios, como moradia, alimentação, roupas etc., na produção de bens e serviços; b) ocupação remunerada em dinheiro ou benefícios, como moradia, alimentação, roupas etc., no serviço doméstico; c) ocupação sem remuneração na produção de bens e serviços, exercida durante pelo menos uma hora na semana: em ajuda a membro da unidade domiciliar que tem trabalho como empregado na produção de bens primários (atividades da agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal ou mineral, caça, pesca e piscicultura), conta-própria ou empregador; em ajuda a instituição religiosa, beneficente ou de cooperativismo; ou como aprendiz ou estagiário; d) ocupação exercida durante pelo menos uma hora na semana: na produção de bens do ramo que compreende as atividades da agricultura, silvicultura, pecuária, extração vegetal, pesca e piscicultura, destinados à própria alimentação de pelo menos um membro da unidade domiciliar; ou na construção de edificações, estradas privativas, poços e outras benfeitorias, exceto as obras destinadas unicamente à reforma, para o próprio uso de pelo menos um membro da unidade domiciliar. (PNAD 1992, 1993, 1995, 1996) Este conceito é mais abrangente que o adotado até 1990 na PNAD. Até 1990, o conceito de trabalho não abrangia o trabalho não remunerado exercido durante menos de 15 horas na semana nem o trabalho na produção para o próprio consumo e na construção para o próprio uso.
  • População Economicamente Ativa (PEA) - É composta pelas pessoas de 10 a 65 anos de idade que foram classificadas como ocupadas ou desocupadas na semana de referência da pesquisa.
  • Taxa de atividade à percentagem das pessoas economicamente ativas, em relação às pessoas de 10 ou mais anos de idade.
  • Taxa de desocupação (ou desemprego aberto) à percentagem das pessoas desocupadas, em relação às pessoas economicamente ativas.
  • Taxa de analfabetismo à percentagem das pessoas analfabetas[2] de um grupo etário, em relação ao total de pessoas do mesmo grupo etário.
  • Taxa de escolarização à percentagem dos estudantes de um grupo etário em relação ao total de pessoas do mesmo grupo etário.

3. APRESENTAÇÃO

Para definir a taxa de fecundidade "ideal", que aponta para a estabilização do crescimento populacional de um país, demógrafos partiram de um pressuposto simples: o de que crianças são geradas por duas pessoas que, um dia, irão morrer e deverão, portanto, ser substituídas por outras duas. A chamada "taxa de reposição" é, por esse motivo, de 2,1 filhos por mulher. O Brasil já teve uma média quase três vezes superior a essa. Hoje, as famílias têm, em média, 2,3 crianças – índice bem próximo do necessário para o equilíbrio populacional. Estaria tudo muito bem não fosse o fato de que essa aparente normalidade esconde uma realidade preocupante: a de que persistem no mapa brasileiro regiões onde as mulheres têm um bebê por ano e chegam ao fim de sua vida fértil com mais de vinte filhos, como alguns países miseráveis da África. Isso não ocorre somente em regiões distantes, mas também nos grandes centros urbanos – as favelas se tornaram ilhas de explosão demográfica dentro das metrópoles. Essas favelas não compartilham o isolamento dos minúsculos municípios rurais, mas se assemelham a eles em outro aspecto: os baixos índices de educação formal.

Além disso, o crescimento populacional se deve também ao desenvolvimento de uma economia. As mais pobres regiões brasileiras são as que têm as mais altas taxas de fecundidade. Nas mais ricas, é o oposto. A região com o menor índice de fecundidade do Brasil é a Região Sudeste (2,10), que como sabemos é a mais industrializada e mais desenvolvida do país, enquanto a Região Norte tem a taxa de fecundidade mais alta (3,14), e é a região mais rural, menos desenvolvida do país. Sabe-se também que mulheres que não tiveram acesso ao estudo têm até três vezes mais filhos do que as que cursaram a universidade.

O processo de urbanização foi um dos fatores que contribuíram para refrear o aumento populacional no Brasil. Ao trocarem o campo pela cidade, as pessoas passaram a ter acesso a serviços públicos como saúde e educação. A universalização da previdência também influenciou na redução dos nascimentos, sobretudo porque fez arrefecer a crença, até hoje persistente em áreas rurais, de que a única fonte de renda na velhice viria do trabalho dos filhos – o benefício fez diminuir o temor dos brasileiros de chegar à velhice sem nenhum tostão. Um estudo feito na década de 70 chegou à curiosa conclusão de que as telenovelas foram outro fator a ajudar no encolhimento dos lares, pois nas novelas exibiam-se famílias com dois filhos por casal e isso foi se tornando um padrão.

A história das políticas de planejamento familiar é cheia de idas e vindas. Embora a distribuição de preservativos pelos hospitais públicos tenha começado nos anos 70, foi só a partir de 1996, por força de lei, que camisinhas e anticoncepcionais começaram a chegar sistematicamente às regiões mais pobres e distantes das grandes cidades. Agora, o governo federal está preparando um pacote de medidas que promete aumentar a opção de anticoncepcionais ofertados pelo Estado e dobrar o número de hospitais públicos que fazem esterilizações, hoje disponíveis em menos de 10% dos municípios brasileiros.

Tudo isso mostra que regiões com diferentes níveis de instrução e riqueza têm de ser alvo de políticas específicas.

4. DESENVOLVIMENTO

Antes de traçar o perfil sócio-econômico das regiões, iremos mostrar como a taxa de fecundidade evoluiu no Brasil no decorrer das últimas décadas.

A fecundidade está associada à procriação humana, em termos do número efetivo de filhos em relação às mulheres em idade reprodutiva. Do ponto de vista demográfico, a análise da fecundidade tenta medir em que grau e como vão ocorrendo os nascimentos. A importância deste dado está no fato de que eles determinam, juntamente com a mortalidade e as migrações, o crescimento e a estrutura da população. Também, o número de filhos que as mulheres têm está estreitamente relacionado com aspectos tais como a saúde materno-infantil e aspectos sociais ligados à formação das famílias.

No Brasil, os níveis da fecundidade feminina mantiveram-se em níveis elevados até meados da década de 60, momento em que se inicia a difusão dos métodos anticonceptivos orais no País. Até 1960, a Taxa de Fecundidade Total, estimada para o País, era um pouco superior a 6 filhos por mulher. Os resultados do Censo Demográfico de 1970 mostraram uma pequena redução neste indicador (5,76 filhos por mulher), como reflexo da diminuição mais acentuada da fecundidade na Região Sudeste. Por se tratar da Região mais urbanizada do país, proporcionando um maior acesso aos meios existentes para evitar uma gravidez não desejada, e dispor de um parque industrial e de uma rede de comércio e serviços, impulsionadores da economia nacional, que absorvia um número cada vez maior de mão-de-obra feminina, a Região Sudeste do Brasil foi a primeira a experimentar a maior redução no nível da fecundidade: quase 2 filhos de 1960 para 1970. Nas demais regiões, o início da transição da fecundidade, de altos para baixos níveis, iniciou-se na década de 70.

Em 1970, os diferenciais de fecundidade entre as Grandes Regiões ainda eram bastante acentuados. As Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste possuíam as mais elevadas taxas de fecundidade (8,15; 7,53 e 6,42 filhos por mulher, respectivamente), enquanto que a Região Sudeste era detentora da mais baixa (4,56 filhos por mulher).

Já em 1980, observou-se que todas as Grandes Regiões brasileiras estavam em franco processo de redução da fecundidade, afastando-se, somente, da média nacional, as Regiões Norte e Nordeste. A partir daí, o declínio da fecundidade no Brasil acentuou-se, uma vez que a esterilização feminina passou a exercer um importante papel para a limitação do número de filhos. Os resultados para o Brasil e Grandes Regiões, incorporando as estimativas preliminares da Taxa de Fecundidade Total, calculadas com base nas informações preliminares do Censo Demográfico de 2000, encontram-se na Tabela 1[3].

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É interessante observar que os níveis estimados da fecundidade para as Grandes Regiões encontram-se bastante próximos ao da média nacional (2,35 filhos por mulher, em 2000). Porém, um ponto que merece ser destacado faz referência à proximidade dos valores alcançados pelas respectivas Taxas de Fecundidade Total das Regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste àquele que, desde a ótica demográfica, é considerado como o número médio de filhos por mulher que garante a reposição das gerações, ou seja, 2,1. Percebemos também que apesar da taxa de fecundidade ter diminuído muito, a Região Norte sempre teve a maior taxa entre as regiões.

A Tabela 2[4] mostra a estrutura da fecundidade nas diferentes faixas etárias:

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Quanto à estrutura da fecundidade por grupos de idade das mulheres ao longo do período fértil, podem ser observadas reduções das taxas em todas as faixas etárias, no transcurso de 20 anos (período 1980-2000). A exceção fica por conta, exclusivamente, das mulheres jovens de 15 a 19 anos, que experimentaram, nesse período, aumento da fecundidade.

5. ANÁLISE DO PERFIL SÓCIO-ECONÔNICO DAS REGIÕES DO BRASIL

Agora, iremos analisar os dados de cada região, através das tabelas dos Indicadores Sociais Mínimos.

Tabela 3 – Aspecto demográfico das regiões e do Brasil, segundo projeção total da população, taxa de crescimento anual, taxa de fecundidade total e taxa de mortalidade infantil

Brasil e Grandes Regiões

Projeção da População Total

Taxa de Crescimento anual (1)

Taxa de Fecundidade Total (2)

Taxa de Mortalidade Infantil / mil (2)

Brasil

165.371.493

1,4

2,35

34,8

Norte

12.342.627

2,4

3,16

32,7

Nordeste

46.995.094

1,1

2,63

52,8

Sudeste

70.190.565

1,4

2,10

25,7

Sul

24.546.983

1,2

2,22

22,8

Centro-Oeste

11.296.224

2,2

2,22

26,1

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Permanecem os dados de 1996.
(2) Estimativas para 1999 extraídas do documento IBGE/DPE/DEPIS "projeção da população das Grandes Regiões por sexo e idade 1991 - 2020".

Analisando verticalmente esta tabela, podemos concluir que a Região Norte é a que apresenta a maior taxa de crescimento populacional anual (2,4), e isso é reflexo da sua taxa de fecundidade, que também é a maior entre as regiões (3,16), tornando essa região a nossa unidade de análise.

Tabela 4 – Relação entre a taxa de fecundidade total e a taxa de urbanização das regiões brasileiras e do Brasil

Brasil e Grande Regiões

Taxa de Urbanização (%)

Taxa de Fecundidade total (1)

Brasil

78,4

2,35

Norte

62,4

3,16

Nordeste

65,2

2,63

Sudeste

89,3

2,10

Sul

77,2

2,22

Centro-Oeste

84,4

2,22

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Estimativas para 1999 extraídas do documento IBGE/DPE/DEPIS "projeção da população das Grandes Regiões por sexo e idade 1991 - 2020".

Com os números desta tabela percebemos que a Região Norte é a que apresenta a menor taxa de urbanização do Brasil (62,4%), contra os 89,3% da taxa de urbanização da Região Sudeste, que é a maior. Se considerarmos a taxa de fecundidade da Região Sudeste, que é de 2,10, ou seja, a menor taxa de fecundidade do Brasil, podemos dizer que a taxa de urbanização de uma região está intimamente relacionada com a taxa de fecundidade, já que a taxa de fecundidade da Região Norte é a maior (3,16). Podemos dizer que a taxa de urbanização influencia inversamente na taxa de fecundidade, onde a taxa de urbanização é maior a de fecundidade é menor e vice-versa.

Tabela 5 – Percentagem de uso atual de anticonceptivos entre mulheres (de 15 a 49 anos de idade) que vivem em união em cada região e no Brasil – 1996

Brasil e Grandes Regiões

Algum Método

Esterilização Feminina

Esterilização Masculina

Pílula

Não usa Métodos

Brasil

76,7

40,1

2,4

20,7

23,3

Norte

72,3

51,3

-

11,1

27,7

Nordeste

78,2

43,9

0,4

12,7

31,8

Sudeste

77,8

38,8

2,6

21,8

22,2

Sul

80,3

29,0

3,5

34,1

19,7

Centro-Oeste

84,5

59,5

1,8

16,1

15,5

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

Nota-se que a Região Norte é a que apresenta a menor taxa (72,3%) de uso de algum método anticonceptivo, e entre as que utilizam a pílula anticoncepcional (que é considerado o mais conhecido dos métodos anticonceptivos) é também a que apresenta a menor taxa (11,1%). Portanto o não uso de métodos anticonceptivos pelas mulheres da Região Norte está profundamente relacionada à alta taxa de fecundidade desta região, em relação às outras regiões brasileiras.

É importante observar que não há dados sobre a esterilização masculina na Região Norte.

Tabela 6 – Rendimento médio mensal, taxa de atividade e taxa de desocupação, em cada região e no Brasil – 1999

Brasil e Grandes Regiões

Rendimento Médio Mensal (1), em R$

Taxa de Atividade (2)

Taxa de Desocupação (2)

Brasil (3)

313,3

61,0

9,6

Norte

244,3

58,6 (4)

11,4

Nordeste

144,9

61,1

8,0

Sudeste

273,4

59,0

11,2

Sul

334,4

66,0

8,0

Centro-Oeste

291,3

63,5

9,6

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) População de 10 ou mais de idade, com ou sem rendimentos. O valor em R$ é o valor nominal.
(2) População de 10 anos ou mais de idade.
(3) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá
(4) Exclusive a população rural

Os dados desta tabela são bem interessantes, pois revelam que a alta taxa de fecundidade está mais relacionada às taxas de atividade e de desocupação do que com a renda mensal. Isso porque a Região Norte é quem apresenta a menor taxa de atividade do país (58,6%) e também apresenta a maior taxa de desocupação (11,4%), porém não tem nem a menor nem a maior renda.

É importante salientar que a população rural da Região Norte está excluída da taxa de atividade.

Tabela 7 – Taxa de atividade das pessoas de 15 a 65 anos de idade por sexo em cada região e no Brasil - 1999

Brasil e Grandes Regiões

Total

Homens

Mulheres

Brasil (1)

74,4

85,5

58,2

Norte (2)

69,2

83,2

56,1

Nordeste

71,4

85,6

58,1

Sudeste

69,9

84,0

56,6

Sul

75,9

88,7

63,6

Centro-Oeste

73,2

88,4

58,8

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
(2) Exclusive a população rural.

Tabela 8 - Taxa de desocupação das pessoas de 15 a 65 anos de idade por sexo em cada região e no Brasil - 1999

Brasil e Grandes Regiões

Total

Homens

Mulheres

Brasil (1)

9,9

8,1

12,3

Norte (2)

11,7

9,2

15,1

Nordeste

8,5

7,2

10,4

Sudeste

11,2

9,2

14,1

Sul

8,1

6,7

10,0

Centro-Oeste

9,4

7,0

12,8

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
(2) Exclusive a população rural.

As tabelas 7 e 8 detalham a análise da tabela anterior e mostram que há uma relação entre as taxas de atividade e de desocupação e a taxa de fecundidade. Podemos ver que a Região Norte tem a maior taxa de desocupação (11,7) e a menor taxa de atividade (69,2). É interessante perceber que as pessoas que tem menos estabilidade, menos condições (no caso as que se encontram na Região Norte), são as que têm maior taxa de fecundidade.

Tabela 9 – Taxas de analfabetismo e escolarização por sexo em cada região e no Brasil – 1999

Brasil e Grandes Regiões

Taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de idade

Taxa de escolarização das crianças de 7 a 14 anos de idade

Total

Homens

Mulheres

Total

Homens

Mulheres

Brasil (1)

13,3

13,3

13,3

95,7

95,3

96,1

Norte (2)

11,6

11,7

11,5

95,5

95,3

95,7

Nordeste

26,6

28,7

24,6

94,1

93,2

95,0

Sudeste

7,8

6,8

8,7

96,7

96,6

96,9

Sul

7,8

7,1

8,4

96,5

96,7

96,3

Centro-Oeste

10,8

10,5

11,0

96,0

95,6

96,4

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
(2) Exclusive a população rural.

Os dados desta tabela estão bastante comprometidos, pois a população rural da Região Norte está excluída. Considerando que essa região é a que apresenta a menor taxa de urbanização do Brasil, se torna comprometedor a análise desses dados relacionando-os com a taxa de fecundidade[5], pois as pessoas da área rural não devem ter alta escolaridade, e assim as taxas do Norte seriam mais baixas.

Tabela 10 – Média de anos de estudo das pessoas de 10 anos ou mais de idade por sexo em cada região e no Brasil – 1999

Brasil e Grandes Regiões

Média de anos de estudo

Total

Homens

Mulheres

Brasil (1)

5,7

5,6

5,9

Norte (2)

5,7

5,5

5,9

Nordeste

4,3

4,0

4,7

Sudeste

6,5

6,4

6,5

Sul

6,2

6,2

6,3

Centro-Oeste

5,9

5,7

6,2

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
(2) Exclusive a população rural.

Mais uma vez a relação entre escolaridade e taxa de fecundidade está comprometida, pois a população rural da Região Norte está excluída [6].

Tabela 11 – Número de pessoas por família e por dormitório em cada região e no Brasil - 1999

Brasil e Grandes Regiões

Número médio de pessoas por família

Número médio de pessoas por dormitório

Brasil (1)

3,4

1,9

Norte (2)

3,9

2,1

Nordeste

3,7

2,0

Sudeste

3,3

1,9

Sul

3,3

1,8

Centro-Oeste

3,4

1,8

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
(2) Exclusive a população rural.

Por ser a Região Norte aquela que apresenta a maior taxa de fecundidade, estes números são reflexos dessa condição, ou seja, essa região apresenta maior número médio de pessoas por família e de pessoas por dormitório, 3,9 e 2,1, respectivamente.

Tabela 12 – Percentagem das famílias por classes de rendimento médio familiar em cada região e no Brasil - 1999

Brasil e Grandes Regiões

Até 2

Mais de

2 a 5

Mais de

5 a 10

Mais de

10 a 20

Mais de 20

Sem (3)
Rendimento

Brasil (1)

27,6

32,2

18,6

9,9

5,9

3,5

Norte (2)

29,2

34,9

17

8,6

4,3

5,4

Nordeste

47,5

29,7

9,2

4,4

2,7

4,2

Sudeste

17,7

32,2

23,5

13

7,8

3,1

Sul

22,2

34,5

21,7

11,3

6,4

2,6

Centro-Oeste

26,7

35

17,9

9,2

6,5

3,4

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE.

(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
(2) Exclusive a população rural.
(3) Exclusive os sem declaração de renda.

A informação importante que traz essa tabela é que a Região Norte tem a maior percentagem de população sem rendimentos (5,4%), isto é um fator interessante, pois sendo esta região a de mais alta taxa de fecundidade, pode-se relacionar esse fato a pobres terem mais filhos. É interessante perceber que as regiões, Norte e Nordeste têm a percentagem de rendimento decrescente conforme aumenta a quantidade de salários mínimos.

Tabela 13 – Percentagem de domicílios com luz elétrica em cada região e no Brasil - 1999

Brasil e Grandes Regiões

Luz Elétrica

Brasil (1)

94,8

Norte (2)

97,8

Nordeste

85,8

Sudeste

98,6

Sul

98,0

Centro-Oeste

95,0

Fonte: Indicadores Sociais Mínimos, IBGE

(1) Exclusive a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá.
(2) Exclusive a população rural.

Essa tabela seria mais útil se estivesse representado nela a população rural da Região Norte, pois é lá que não se tem luz elétrica e devido a isso não se tem meios de comunicação (TV, rádio), sendo esse um fator que pode influenciar a taxa de fecundidade, pois sem meios de comunicação não se tem informações, sobre como prevenir uma gravidez utilizando métodos anticonceptivos (assim, a falta de energia também influencia na taxa de utilização de métodos anticonceptivos).

6. CONCLUSÃO

A partir dos dados analisados, concluímos que a Região Norte é a que detém a maior taxa de fecundidade (3,16), enquanto que a Região Sudeste tem a menor taxa (2,10), essa primeira diferença se deve principalmente a taxa de urbanização que na primeira é de 62,4% e na segunda é de 89,3%, sendo estes os dois extremos do Brasil. Assim, temos que a urbanização é um fator de grande importância para o controle da taxa de fecundidade.

Também percebemos que o uso de métodos anticonceptivos é menor na Região Norte, sendo esta a causa da maior taxa de fecundidade desta região. Isso se deve a população rural que existe nessa região, pois nessa área não se tem muita informação sobre métodos de prevenção, já que a energia elétrica não chega a essa população e por isso não se tem meios de comunicação em massa; e também, por ser uma área rural, a população tem em mente que ter mais filhos é bom, pois, são eles que trabalharão na agricultura familiar, isto é, é daí que vem a mão-de-obra necessária para a subsistência.

Na Região Norte, encontramos a maior taxa de desocupação (desemprego aberto) e a menor taxa de atividade, assim o que é interessante perceber é que essa população tem uma situação de vida muito precária e instável e mesmo assim é onde se tem mais filhos, é a população que tem maior taxa de crescimento (2,4), podendo se explicar por aí, uma das causas do aumento da população pobre no Brasil. Pois, não é que as pessoas estão ficando pobres, mas sim que as pessoas pobres estão tendo mais filhos e assim aumentando sua população.

A taxa de escolaridade, medida em anos de estudo, seria uma das nossas principais hipóteses, porém como se exclui a população rural do Norte, nossos dados ficam comprometidos, pois é nessa área que se encontra o maior número de analfabetos, ou pessoas com poucos anos de estudos e daí que por falta de instrução eles tendem a se casar mais cedo e ter mais filhos.

Assim, como conseqüência da maior taxa de fecundidade estar na Região Norte temos nesta região o maior número de pessoas por família e o maior número de pessoas por dormitório, esses números seriam maiores ainda se a população rural não tivesse sido excluída.


[1] Definições retiradas do site do IBGE: www.ibge.gov.br

[2] Analfabeta - pessoa que não sabe ler e escrever um bilhete simples no idioma que conhece.

[3] Tabela retirada: Oliveira, J. C - A fecundidade no Brasil e Regiões nos últimos vinte anos do século XX.

[4] Tabela retirada: Oliveira, J. C - A fecundidade no Brasil e Regiões nos últimos vinte anos do século XX

[5] Procuramos dados no site do IBGE, que poderiam completar essa informação, mas não foi encontrado

[6] Procuramos dados no site do IBGE, que poderiam completar essa informação, mas não foi encontrado

8. BIBLIOGRAFIA

Oliveira, Juarez de Castro. A fecundidade no Brasil e regiões nos últimos vinte anos do século

XX (Versão Preliminar com informações do Censo 2000)

Revista Veja – 09 de junho de 2004

www.ibge.gov.br

Trabalho Final de Indicadores Sociais – ano 2004