segunda-feira, 20 de julho de 2009

A voz do passado – História oral – A Entrevista e Modelos de Perguntas – Paul Thompson

Existem diferentes tipos de entrevistas, que variam desde uma conversa amigável até o estilo mais formal e controlado de perguntar. As qualidades de um bom entrevistador são: interesse e respeito pelos outros como pessoas e flexibilidade nas reações em relação a eles; capacidade de demonstrar compreensão e simpatia pela opinião deles; e, principalmente, disposição para ficar calado e escutar.

Pode-se começar pela preparação das informações por vários meios, ou com entrevistas exploratórias, mapeando o campo e colhendo idéias e informações. O entrevistador aprende com a entrevista, é bom que o entrevistado seja mais bem informado que o entrevistador, pois se consegue detalhes preciosos. Para que se instaure respeito e confiança entre entrevistador e entrevistado é preciso de um conhecimento básico sobre os termos. É impertinente submeter alguém a um interrogatório, sendo ele especialista ou não, sem ter certeza de que as perguntas são historicamente relevantes e estão corretamente formuladas para aquele contexto.

Estabelece-se uma diferença entre os questionários de perguntas fechadas e uma “conversa” livre onde o entrevistado é convidado a falar de um assunto de interesse comum. Este último tipo não existe, pois uma entrevista precisa de uma pergunta inicial, de estabelecer objetivos, e estar dentro de um contexto, não se pode falar sobre qualquer coisa. Quando esse tipo de entrevista foi realizada não deu certo, pois acabou sendo curta, e só se desenrolando a partir do momento que o entrevistador começou a perguntar. Porém o estilo de entrevista com questionário rigidamente inflexível não é apoiado pelos historiadores orais.

Existem alguns princípios básicos para a elaboração das perguntas, elas devem ser: sempre tão simples e diretas e em linguagem comum; não fazer perguntas de duplo sentido; evitar fraseado que leve a resposta indefinida; é preciso fazer pergunta que demonstre segurança do entrevistador, mostrando que ele sabe o que esta fazendo; deve-se evitar perguntas diretivas, o entrevistador não pode demonstrar sua opinião, pois influirá nas respostas; não se deve fazer perguntas que levem os informantes a pensar do modo do entrevistador e sim do modo deles.

O uso de gravador pode assustar o entrevistado, que pode suspeitar de algo ou por não “conhecer” a tecnologia, porém normalmente as pessoas aceitam que se use o gravador. É preciso saber usa-lo não chamando a tenção e nem se preocupando com ele durante a entrevista. Para estimular a entrevista pode-se levar objetos que tenha a ver com a sociedade a ser pesquisada e com o tema da pesquisa.

Para fazer a entrevista é bom escolher um lugar onde a pessoa se sinta à vontade, e também é melhor que o informante esteja sozinho, pois a presença de uma terceira pessoa pode influenciar nas respostas. Quando uma primeira parte da entrevista é feita e precisa-se de um novo encontro, é legal o uso de uma carta explicando o motivo e os objetivos da pesquisa, a carta não pode ser muito grande, mas deve conter as informações essenciais para que o entrevistado possa ir pensando em como e o que vai falar.

A seguir, o autor descreve como deve transcorrer uma entrevista, como se deve usar o gravador, como fazer as perguntas, como agir em determinados momentos e o que deve fazer ao encerrar a entrevista. Também mostra as “barreiras” que podem existir, com relação à classe social, idade, sexo e raça.

Quando termina a entrevista é preciso relatar o mais rápido os comentários sobre o contexto dela, fazendo seus comentários; depois escutar a fita para ver se tudo transcorreu bem. Saber agradecer também é uma forma de saber entrevistar.

No outro item, o autor, coloca alguns modelos de perguntas.

Resenha Pesquisa Qualitativa – ano 2003

A Elite Eclesiástica Brasileira – Sérgio Miceli

Os processos de habilitação do jovem desejoso de ingressar na organização eclesiástica eram os documentos produzidos devido a exigências canônicas. Através desses documentos é que a Igreja fazia a investigação sobre as origens sociais do jovem, “pureza de sangue”, sua naturalidade, local de residência, profissão, legitimidade da condição familiar, etc. E todos esses dados eram obtidos através de testemunhas fidedígnas. Depois, o vigário do local onde o habilitando morava fazia perguntas, durante a missa, sobre ele, para confirmar os dados já obtidos. Por último, investigava-se o patrimônio da família do habilitando e quanto ela poderia dispor à Igreja (como pagamento pelos estudos do filho no seminário).

A grande maioria de documentos acessíveis a respeito do clero, em geral sobre integrante da alta hierarquia, foi produzida por membros da organização eclesiástica ou por intelectuais católicos especialistas em trabalhos de propaganda e celebração. Parte das biografias é de autoria de padres com pretensões de acesso ao episcopado, empenhados em relatar a trajetória de seus antecessores hierárquico como estratégia antecipada de canonização ou ainda podiam ser elaboradas histórias eclesiásticas regionais. Estas obras eclesiásticas são instrumentos eficazes nas lutas internas, no que tange o acesso aos postos de comando organizacional, empenhadas em firmar uma tradição de dinastias, cujas chances de continuidade passam a depender dos mandatos episcopais dos próprios biógrafos e assim oferecem uma avaliação circunstanciada das condições sociais em que foram produzidas. Os testamentos são a única fonte autobiográfica redigida pelos “prelados” e “constituem um balanço das iniciativas de uma gestão diocesana, da perspectiva do mentor e principal interessado”, além de ajudarem na reconstrução da divisão do trabalho religioso nas dioceses e conterem informações sobre momentos marcantes da trajetória política dos bispos no interior da corporação eclesiástica.

Além dessas fontes biográficas, haviam as histórias de vida, os perfis dos prelados, e as poliantéias. “As histórias de vida contemplam um elenco diversificado de membros destacados do clero que firmaram sua reputação em função dos serviços especializados que prestaram à organização eclesiástica”. Essas obras baseavam-se na vida dos santos, com virtudes excepcionais, vocações, sua vida modelo, etc. Os perfis biográficos foram possíveis, pois seus autores mantiveram convívio íntimo e prolongado com seus homenageados/protetores, e os próprios autores buscavam identificar essas relações nos documentos, bem como a confiança que lhes era depositada. As poliantéias “são obras editadas apenas em circunstâncias bastante especiais, em geral como livros comemorativos do jubileu episcopal, às vezes por encomenda do próprio interessado”. Até mesmo as edições, capas, fotos eram mais luxuosas que as normais. Fotos dos principais momentos do homenageado, textos exaltando suas virtudes, etc, compunham essas obras.

Além disso, muitos foram os intelectuais que escreveram obras clericalistas. Alguns uniram a defesa dos interesses eclesiásticos junto às instâncias e autoridades governamentais. Assim, os ‘prelados’ se dividem em três grupos. Em primeiro, pelos filhos da antiga aristocracia imperial, que tinham interesses econômicos, comerciais e eram proprietários de terras e engenhos. Os segundos, eram os filhos do patriarcado rural falido ou decadente, e viviam às custas das corporações eclesiástica e militar. E os terceiros, eram jovens entregues aos cuidados de algum membro do clero, de uma ordem religiosa ou de um seminário, que assumem os encargos de reprodução material e educação desses jovens e deles se apossam como ‘donos’.

Resenha Pesquisa Qualitativa – ano 2003

Problemas de Inferência e Prova na Observação Participante - Becker

Becker inicia seu texto colocando que o observador participante coleta dados através de sua participação na vida cotidiana do grupo ou organização que estuda”. Esse método de observação permite a obtenção de descrições detalhadas e dados variados. É possível distinguir três estágios de análises, no próprio campo de análise, e um quarto, depois do término do trabalho de campo.

1º) seria “a seleção e a definição de problemas, conceitos e índices”. O observador em sua pesquisa deve selecionar os conceitos e definir os problemas que deseja tratar. A seleção de indicadores pode: ter um indicador para alguma classe ampla de fenômenos; ou buscar indicadores específicos para utilizar em cada estudo, neste estágio, o pesquisador está utilizando seus dados somente para especular sobre possibilidades.

As evidências de uma pesquisa são obtidas através de declarações de membros dos grupos analisados, mas é preciso ter em mente que esses membros podem faltar com a verdade em seus relatos, permitindo questionar sobre a credibilidade dos informantes.

O valor da evidência deve levar em conta: o fato dela ter sido obtida espontaneamente ou através de pergunta do observador, sendo mais válida quando espontaneamente; a presença de pessoas ou não no momento em que a observação é feita; e o papel do observador no grupo, pois como o observador é definido pelo grupo influi o que será dito pelos sujeitos observados.

2º) seria o controle da freqüência e da distribuição de fenômenos, no qual o observador deve tentar evidenciar entre os problemas, conceitos e indicadores anteriormente obtidos, quais são os mais relevantes. Na observação participante a coleta é feita num processo chamado de “quase-estatística”. Para o observador é preferível ter vários tipos de evidências sobre uma mesma questão, para poder avaliar melhor e tirar melhores conclusões.

3º) seria a “construção de modelos de sistemas sociais”. O estágio final de análise no campo consiste na incorporação de descobertas individuais ao modelo generalizado do sistema ou da organização social em estudo ou de alguma parte desta organização. O observador deve construir um modelo que permita compreender as relações entre os elementos e passa a “refinar” constantemente seu modelo.

4º) seria a “análise final e a apresentação dos resultados”, que é realizada depois que o trabalho de campo terminou e consiste numa rechecagem e reconstrução dos modelos; sendo necessário fazer uma conceitualização do problema. O observador torna-se mais cuidadoso e sistemático na produção deste modelo final. Escolhe as hipóteses e de acordo como ela refutam ou não as evidências.

Depois é preciso saber como apresentar as conclusões. Os dados da observação participante não podem ser apresentados colocando-se como contraste os dados e procedimentos quantitativos com os qualitativos . Uma maneira pode ser apresentá-los da maneira como elas – as evidências – chegam até o observador e como são formadas a partir daí as conclusões.

Resenha Pesquisa Qualitativa – ano 2003

sábado, 18 de julho de 2009

O suicídio e os fatores cósmicos – Émile Durkheim

Introdução

No trabalho que será apresentado a seguir, tentamos expor como foi feita a pesquisa e o que se concluiu no texto “O suicídio e os fatores cósmicos”, mostrando as hipóteses e provando-as, e achando as relações, quando existe, entre elas. E no final, colocamos também a nossa conclusão desse estudo.

O suicídio e os fatores cósmicos

No texto “O suicídio e os fatores cósmicos”, o suicídio é a variável a ser explicada e os fatores cósmicos é a variável explicativa, que sofre influência de uma terceira variável que são as relações sociais. Entre os fatores cósmicos dois se destacam: o clima e a temperatura.

O local tomado como base para o estudo é a Europa, então é a partir de seus fatores que será formulada a pesquisa e dela será tirada a conclusão.

A primeira hipótese a ser testada é o clima. Durkheim, baseado nos estudos de Morselli, em como os suicídios se distribuem no mapa da Europa, segundo os diferentes graus de latitude, observa que nos países localizados em zona mais temperada, há maior desenvolvimento do suicídio; porém, isso não pode ser comprovado, pois este fato não é constante em todos os países de clima temperado; e na Itália, onde o clima é constantemente o mesmo (temperado), a taxa de suicídio é a menor. Portanto, não compensa insistir numa hipótese que não foi comprovada e é contrariada pelos fatos.

Uma segunda hipótese é a influência da temperatura na taxa de suicídio. Durkheim expõem que pelo senso comum e pela simplicidade do fato (considerado pelas pessoas comuns), as pessoas são levadas a crer que é nas estações frias que ocorre um maior número de suicídio, mas baseado nos dados estatísticos pode-se perceber que é nas estações mais quentes que ocorre maior número de suicídios. Baseado em Ferri e Morcelli, ele coloca que o calor tem uma influência direta no suicídio, uma vez que aumenta a excitabilidade do sistema nervoso e provoca uma alienação mental, mas isto é posto a prova, pois os suicídios podem ser resultados de uma depressão extrema e não é provado que as estações interfiram na movimentação da curva de alienação mental.

Tudo o que se pode concluir desses fatos é que as temperaturas extremas sejam as mais quentes ou as mais frias, favorecem o desenvolvimento do suicídio. E, se a causa fundamental das oscilações fosse a temperatura o suicídio deveria variar com ela, porém isto não acontece. Desse modo, percebe-se que somente a temperatura não influi diretamente na taxa de suicídio, então deve haver um terceiro fator que também influencia nas taxas de suicídio.

Uma outra hipótese é que deve haver uma relação entre a duração do dia e as taxas de suicídio; percebe-se que nas sociedades européias, mesmo o suicídio sendo dividido de forma igualitária entre os meses, o número maior de suicídio ocorre durante o dia; isso é o que prova a relação entre a taxa de suicídio e a duração do dia, mas não prova completamente. Assim, é natural que os suicídios aumentem à medida que os dias fiquem mais longos. Isto se explica, pois o dia favorece o suicídio porque é nele que se tem uma maior relação entre as pessoas, ou seja, a vida social é mais intensa. Observamos o auge do suicídio na parte da manhã e da tarde, que é onde o movimento dos negócios é mais rápido. Percebe-se também que o suicídio diminui conforme chega o final de semana.

De certo, “a vida urbana é também mais ativa durante o período de Verão. As comunicações são mais fáceis nessa altura do ano e, por isso, as deslocações multiplicam-se e as relações intersociais tornam-se mais numerosas”. Com tudo isso, observamos a terceira variável, citada no início do texto, que são as relações sociais.

Portanto, conclui-se que as ações diretas dos fatores cósmicos não podem explicar as variações mensais ou temporárias dos suicídios, se as mortes voluntárias são mais numerosas quando as temperaturas são elevadas não é porque o calor tem uma influência perturbadora nos organismos e sim porque as relações sociais são mais intensas. Ou seja, os fatores, como o clima e a temperatura, não podem ser diretamente as causas do suicídio, mas sim influenciados pelas relações sociais, que são diferentes em cada época, causam um aumento na taxa de suicídio.

Conclusão

Nós concluímos que, através dos estudos de Durkheim, nada influi tão diretamente nas pessoas, e na sociedade como as relações sociais; mesmo as taxas de suicídios sendo influenciadas pelos fatores cósmicos, há uma terceira variável que determina, e sem ela as coisas não têm nexo, que são as relações sociais.

Trabalho de Pesquisa Social – ano 2002

sexta-feira, 10 de julho de 2009

: “Treinando a Observação Participante” - William Foote-Whyte

Em seu texto, William Foote-Whyte estuda a observação participante através da observação que fez em Cornerville, tendo como “auxiliar” Doc (possivelmente um amigo seu, e morador de Cornerville). Doc era uma pessoa influente, que conhecia grupos nos quais William estava interessado, assim ele era um “indivíduo-chave”. Porém, os indivíduos-chaves eram as pessoas líderes ou importantes dentro dos grupos, pois eram eles que davam o maior número de informações sobre o grupo, e era a esses líderes que William deveria dar alguma explicação sobre si ou sobre sua pesquisa, se fosse necessário. Mas William percebeu que sua aceitação iria depender mais das relações pessoais que formasse do que de suas explicações. O relacionamento de William e Doc fez com que este se tornasse um colaborador da pesquisa, passando a se interessar cada vez mais, e assim, o comportamento de Doc adequou-se ao enfoque da pesquisa, porém era preciso trabalhar com outros indivíduos.

William fez poucas entrevistas formais, ele participava das discussões de rua, e acabava interagindo, pois isso era necessário para obter a confiança e a aceitação do grupo. Ele estava ciente de que não deveria fazer interrogatórios com as pessoas com as quais interagia e também que era preciso saber o que perguntar e qual o momento certo de perguntar, muitas vezes era preciso escutar mais do que perguntar, para que as pessoas não se retraíssem e acabassem não fornecendo dados de que ele necessitava e objetivava.

O fato de William ser diferente atraía as pessoas do grupo, assim percebeu que as pessoas não desejavam que ele fosse igual a elas. Por mais que interagisse com o grupo, não deveria tornar-se o centro do grupo ou ter posição de destaque. Porém, deveria ser agradável, e procurar de forma alguma não influenciar nas decisões e comportamentos do grupo; mas tentar ser útil ao grupo na medida do possível e sem que isso interfira na sua observação e no modo como as pessoas iriam se comportar em sua presença. No final, o autor mostra a necessidade de organizar os dados obtidos para que se possa, posteriormente, consultá-los quando necessário.

Resenha – Pesquisa Qualitativa em CSo – ano 2003

“A História de Vida e o Mosaico Científico” - Becker

A história de vida tenta reunir material útil para a formulação da teoria sociológica. Quando uma pessoa fala sobre sua própria vida é chamado história de vida. É preciso ter em mente que o que a pessoa diz muitas vezes é aquilo que gostaria que os outros pensassem sobre ela, e com isso pode omitir fatos relevantes. Cabe ao sociólogo confrontar os dados obtidos com as evidências disponíveis, e interpretar honestamente; porém, é preciso dar espaço para que o entrevistado interprete sua própria história.

Os documentos de história de vida desempenham algumas funções, podendo servir como meio de avaliação de uma teoria corrente, pois pode negar essa teoria com os seus dados obtidos, determinando sua invalidez. Assim, por fornecer mais detalhes a pesquisa, faz com que esta seja mais precisa, além de que pode ser desenvolvida quando a área a ser analisada não fornecer dados relevantes e suficientes.

Dessa maneira, ajuda na compreensão das áreas, e das pessoas, com que está relacionada. Mas pode também fornecer uma visão subjetiva de instituições já estudadas.

Sua utilização possibilita que se conheça o processo social (das interações sociais) em que o objeto estudado está inserido, além de possibilitar o conhecimento/compreensão de setores da sociedade que informalmente e geralmente não se conheceria.

Resenha – Pesquisa Qualitativa em CSo – ano 2003

“Do Individual ao Social: a Abordagem Biográfica” - Digneffe

Para a autora Françoise Digneffe a utilização do método de relatos (história) de vida proporciona alguns benefícios para a pesquisa desenvolvida. Esse método permite sair da oposição entre o indivíduo e a sociedade, uma vez que apesar de ser “sempre uma história única, essa história individualiza a história social coletiva de um grupo ou de uma classe, é ao mesmo tempo o produto e a expressão dessa classe”. Esse método também permite compreender, de maneira lógica, a visão subjetiva do homem, relacionando-a a realidade objetiva da história.

Assim, o método biográfico permite, do ponto de vista da interação social, compreender como a conduta dos indivíduos se modela e remodela. Sua utilização é válida também quando outros métodos não conseguem explicar elementos fundamentais da realidade social. Além disso, possibilita a compreensão de um valor sociológico no indivíduo que relata.

Dessa forma, as investigações em Ciências Sociais que utilizam a abordagem biográfica levam em consideração as mudanças que ocorrem na história, pois afetam na constituição dos relatos.

Para a formação da amostra é preciso garantir que haja representatividade do conjunto/grupo a ser estudado, ou seja, deve haver uma grande diversificação social e institucional dos entrevistados para que a representatividade tenha coerência. Ao mesmo tempo, na investigação deve-se buscar recolher o maior número de dados relevantes para a pesquisa, até obter-se o “ponto de saturação”. O entrevistado deve ter conhecimento do tema da entrevista para assim poder contar, relatar sobre ele; o entrevistador deve escutar, apreender, e pode, se necessário for, lembrar sutilmente o tema ao entrevistado.

Para a entrevista deve-se elaborar um guia de entrevista (roteiro), não para comandá-la, mas para orientar-se sobre aspectos importantes a serem tratados. Mas vale lembrar que este pode ser modificado no momento da entrevista, de acordo com o relato dado.

Resenha – Pesquisa Qualitativa em CSo – ano 2003

“A Política dos outros – O cotidiano dos moradores da periferia e o que pensam do poder e dos poderosos” - Teresa Pires do Rio Caldeira

No texto a autora analisa as entrevistas de moradores da periferia, sobre o que eles pensam sobre a vida em sociedade, comentários sobre fatos variados, relatos de experiências, opiniões, etc. O que estas entrevistas demonstram não é uma novidade, mas demonstram a vida de um determinado grupo social, em um espaço delimitado de tempo, porém não coincidem com relatos do dia-a-dia, pois a entrevista conduz a uma reflexão, a um discurso organizado e a uma visão mais global do cotidiano. A autora, antes de iniciar a análise das entrevistas, explica como foram estruturadas estas análises, a flexibilidade da entrevista, os dados de observação participante, e por fim, aplica seus conhecimentos teóricos e empíricos a fim de construir sua interpretação a respeito. O objetivo das entrevistas era o de explorar representações sobre a sociedade em que viviam as pessoas entrevistadas, e a sua relação com o poder político.

Caldeira diz que ao olhar para sociedade percebe-se uma dicotomia básica: a oposição entre pobres e ricos. Outra característica apontada é o fator trabalho, que representa uma relação de dependência mútua, de poder e de exploração entre ricos e pobres. Outro fato observado, é que as valorações dadas ao ser rico ou ser pobre são móveis e variam de acordo com a situação. Há uma grande mobilidade das classificações e uma gradação no que se refere à pobreza e à riqueza, porém há a um elemento que é visto de forma intermediária: a classe média.

Através dos depoimentos, a autora percebeu que a maioria dos entrevistados acredita em uma mobilidade social. No que diz respeito às mulheres, a autora mostra que elas imaginam os mesmos mecanismos que os homens para ascender socialmente, no entanto vinculam sua própria ascensão a terceiros, em geral seus maridos e tem consciência dos limites salariais a que estão submetidas. Já os homens possuem projetos de ascensão pessoal e valoram negativamente o casamento classificando-o como uma imposição social.

Para finalizar, a idéia que os entrevistados tem em relação ao governo é de algo neutro, que encontra-se acima da sociedade, numa imagem próxima à de Deus. Conferem-lhe um poder ilimitado e que dele depende o bom funcionamento da sociedade. Não há o reconhecimento do Poder Legislativo. Assim, o governo acaba sendo a vontade de quem governa, de quem ocupa o lugar e é julgado como um aparato, mas como uma “pessoa” com sentimentos e vontades, cujas característica é a mesma identificada nos ricos pelos entrevistados: o egoísmo. Portanto o governo ideal deveria agir é como um pobre. A questão da mulher é novamente retomada no sentido da separação entre publico e privado.

Não é possível fechar a análise porque os fragmentos não formam um sistema. A nossa sociedade é fragmentada e os indivíduos têm múltiplos papéis, porém isso não quer dizer que haja ausência de correlação entre os elementos da fala, mas sim que as articulações entre eles são variáveis e nem sempre são lógicas. Mas isso não é uma falha, pois qualquer conexão apresenta repercussão na vida social da pessoas. Os elementos são compartilhados pela sociedade, mas as conexões são mutáveis. A falta de conexão se deve ao fato de que mudanças em um plano não são necessariamente transpostas aos outros. Se as partes do sistema fossem todas integradas não haveria mudanças parciais e os discursos teriam todos a mesma lógica.

Resenha – Pesquisa Qualitativa em CSo – ano 2003

Pesquisa e crítica das fontes de documentação nos domínios econômico, social e político - Pierre de Saint-Georges

O autor começa o texto falando das diferentes fontes de documentação que podem ser utilizadas em uma pesquisa documental. Existem quatro tipos de fontes de documentação:

1- As fontes não escritas, que podem ser subdivididas em quatro conjuntos:

1.1- Os objetos e vestígios materiais, tais como: vestuário, mobiliário, brinquedos, obras de arte, etc, que nos levam a diferenciar níveis de evolução tecnológica, e o sentido destas evoluções é desvendar o significado destes objetos e sua conotação simbólica.

1.2- A iconografia: que refere-se as pinturas, desenhos, retratos, caricaturas e nos traz a idéia da vida da época que representam.

1.3- As fontes orais não registradas, que são: testemunhos vivos riquíssimos como as tradições orais, canções populares, discursos, depoimentos, entrevistas, etc. Este tipo de fonte embora singular nem sempre é seguro, por isso é preciso ser feito seu registro para que depois possam ser confirmadas e confrontadas.

1.4- Os processos fotográficos ou eletrônicos, que são: as fotografias, os filmes, os discos, o rádio, a TV, etc.

O importante é lembrar que uma única fonte raramente consegue esgotar uma investigação, o ideal é que se combine, por exemplo, fontes não escritas e fontes escritas do objeto investigado, a fim de se chegar a um conjunto completo de informações.

2- As fontes escritas são oficiais quando dependem de uma autoridade pública, isto é, são emitidas pela mesma ou são recebidas por esta mesma autoridade. Além destes documentos da autoridade pública que em geral são chamados de arquivos, há documentos oficiais privados que são aqueles emitidos ou recebidos oficialmente por uma instância privada, normalmente estes documentos são confidenciais e de difícil acesso e possuem um prazo de conservação.

3- As “fontes escritas não oficiais“ são numerosas, entre elas:

3.1- A imprensa: que fornece notícias e fatos e ilustra opiniões de grupos ou categorias sociais determinadas, desempenhando um papel essencial na vida política e social. Há fatores que influem na sua credibilidade, um deles é a periodicidade, quanto mais rápido é o ritmo de publicação, maiores são as chances de erro no controle das informações.

3.2- As revistas e publicações periódicas são outro tipo de fonte e em geral tem uma periodicidade mais lenta e assim, textos mais elaborados. Podem ser classificadas em revistas de ordem geral e revistas especializadas.

3.3- Tem os “livros”, obras históricas, guias turísticos, obras técnicas, livros infantis, manuais, enfim todo conjunto de obras de livraria.

3.4- Os “documentos intermediários”, que são livros e revistas de um tipo particular: dicionários (comuns e especializados), as enciclopédias, os repertórios, os anúncios e os catálogos, as bibliografias que são fontes preciosas de informação e ainda há os boletins sinaléticos (publicações periódicas bibliográficas que assinalam novas publicações relativas a uma disciplina).

4- As fontes estatísticas que são as chamadas fontes numéricas e podem ser:

4.1- estatísticas correntes: fornecem dados de base relativos à vida econômica, social e política em nível nacional, regional, local por domínios e segundo uma periodicidade conhecida e regular, são instrumentos de gestão da vida pública.

4.2- análises estatísticas: são mais que uma apresentação descritiva e fornecem informações estatísticas tratadas.

4.3- dados provenientes de investigações anteriores: é constituído por estudos e investigações originais que foram objeto de uma publicação.

Portanto, a pesquisa documental é um método de recolha e verificação de dados, através da procura e acesso a fontes pertinentes, e apesar de se basear naquilo que já existe pode produzir novos materiais empíricos, recorrendo a fontes existentes, mas até então inexploradas, através de uma documentação inovadora.

Já a pesquisa bibliográfica é utilizada quando se visa descobrir textos sem omitir uma referência essencial, e não aprofundando no que não tem interesse. Em geral é feita em bibliotecas e no geral o esquema é que as primeiras obras consultadas remeterão a outras, procura-se pelas obras mais recentes e separa-se o importante do acessório. Os dicionários são uma outra fonte e conduzem a um trabalho exaustivo.

Porém, todas estas fontes precisam ser lidas de forma seletiva. Os documentos fornecem um testemunho e é preciso examinar metodicamente estes documentos, a fim de que se possa determinar o seu alcance real e o grau de confiança que pode ser conferido a eles, pois um documento oficial pode dizer coisas falsas ou o inverso pode ocorrer. Este procedimento de seleção possui três fases:

1- A crítica interna do documento, que é a interpretação do texto.

2- A crítica externa ou crítica da testemunha, onde são analisados os aspectos materiais do documento

3- A crítica do testemunho, que confirma a informação.

No final dessas etapas é feita uma síntese das investigações, em que se destacam as informações, estabelece-se ao seu respeito uma ordem de certeza sobre o essencial e sobre os pormenores a fim de que sejam identificadas eventuais lacunas. A crítica das fontes não escritas, através da crítica histórica, tem os mesmo objetivos das fontes escritas, com a diferença que nas não escritas os meios tecnológicos podem assumir uma amplitude mais importante.

No final do texto o autor, menciona a crítica das fontes estatísticas que é feita através da estatística enquanto disciplina científica, sem se esquecer que às vezes o próprio objeto da estatística pode ser fonte de erro, que as unidades comparadas devem ser idênticas, a própria confusão no modo de recolha de dados: o questionário e/ou o entrevistado podem, individualmente ou em conjunto, induzir certas respostas e assim alterar a recolha de dados.

Pesquisa Qualitativa em CSo – Resenha – ano 2003

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Situação de entrevista e estratégia do entrevistado – Danielle Ruquoy

     A entrevista torna-se um instrumento fundamental, a partir do momento em que o investigador se interessa cada vez mais pelo indivíduo, em abordar o ser humano profundamente. Existe um paradoxo, pois se interroga o ser singular quando as Ciências Sociais se interessa pelo coletivo, nesse caso o indivíduo é interrogado enquanto representante de um grupo social.
     Para se ter uma entrevista de qualidade é preciso fazer com que o interlocutor se exprima o mais livremente possível e forneça as informações mais completas e precisas sobre o assunto tratado. A utilização da entrevista pressupõe que o investigador não dispõe de dados já existentes, mas que precisa obtê-los, é necessário dispor de dados próprios. O tipo de entrevista tratado no texto é a entrevista semidiretiva, onde é permitido que o próprio entrevistado estruture seu pensamento em torno do objeto perspectivado, e também há a necessidade da intervenção do investigador para que se aprofunde pontos que o entrevistado não teria explicitado.
     A entrevista não pode ser considerada nem o único nem o melhor instrumento de obtenção de dados, ela nos dá informações certamente parciais, mas que conservamos por serem mais acessíveis. A entrevista é o instrumento mais adequado para delimitar os sistemas de representações, de valores, de norma veiculadas por um indivíduo.
     O papel do investigador segue a linha de pensamento do seu interlocutor, ao mesmo tempo em que zela pela pertinência das afirmações relativamente ao objetivo da pesquisa, pela instauração de um clima de confiança e pelo controle das condições sociais da interação sobre a entrevista. O objeto de estudo pode ser definido por dois procedimentos: o procedimento dedutivo e o procedimento indutivo.
     Existem alguns fatores contextuais que podem influenciar na entrevista: a relação social entrevistador/entrevistado, o quadro espaço – temporal, o momento escolhido para a entrevista, a relação com a investigação e a relação com o entrevistador e com seu modo de intervenção.
     Os indivíduos escolhidos para conceder uma entrevista não são escolhidos em função da importância numérica da categoria que representam, mas antes devido a seu caráter exemplar, da diversificação das pessoas interrogadas. A grandeza da amostra de pende da heterogeneidade do público, do grau de complexidade dos objetivos de investigação, da coerência na análise, que as novas informações não façam mais que confirmar as anteriores e que o rendimento não seja decrescente.
    Para conseguir entrevistar os indivíduos selecionados é preciso: revelar o interesse do estudo, a utilização que será feita dele; motivar o interlocutor, fazer desaparecer os receios e explicar como e porque razão a pessoa foi escolhida.
     É preciso aproveitar os momentos-chave da entrevista e saber fazer a intervenção certa na hora certa.

Fichamento – Pesquisa Qualitativa – ano 2003

Manual de Investigações em Ciências Sociais – R. Quivy e Luc Van Campenhoudt

Como o próprio nome diz, esse texto funciona como um manual que ensina como iniciar uma pesquisa, o que se deve fazer e o que não se deve fazer para alcançar os objetivos traçados. Esse texto aborda a formulação de um projeto de investigação, o trabalho exploratório, a construção de um plano de pesquisa ou os critérios para escolha das técnicas de recolha, tratamento e análise de dados; assim o texto foi feito para ajudar o leitor a conceber por si próprio um processo de trabalho.

Pode-se dividir o procedimento de uma pesquisa em sete etapas: a pergunta de partida, a exploração, a problemática, a construção do modelo de análise, a observação, a análise das informações e as conclusões. As três primeiras etapas são agrupadas no ato de ruptura, que consiste em romper com os preconceitos e as falsas evidências, a quarta etapa faz parte do ato de construção e as três últimas etapas são agrupadas no ato de verificação. Esses atos constituem-se mutuamente.

Na etapa de exploração (a mais importante) é constituída pelas operações de leitura, as entrevistas e os métodos complementares. Para escolher bem uma leitura é preciso levar-se em conta: ligações com a pergunta de partida dimensão razoável do programa de leitura, elementos de análise e de interpretação, abordagens diversificadas, intervalos de tempo consagrados à reflexão pessoal e às trocas de ponto de vista. É preciso selecionar cuidadosamente um pequeno número de leituras e de se organizar para delas retirar o máximo de proveito.

As entrevistas exploratórias devem ajudar a construir a problemática de investigação; visa economizar perdas inúteis de energia e de tempo na leitura, na construção de hipóteses e na observação. As principais características a adotar ao longo de uma entrevista são: pôr o mínimo de perguntas possível, intervir da forma mais aberta possível, abster-se de se implicar a si mesmo no conteúdo, procurar que a entrevista se desenrole num ambiente e num contexto adequados e gravar as entrevistas.

As entrevistas, observações e consultas de documentos diversos coexistem freqüentemente durante o trabalho exploratório. Esses são “passos” básicos para uma boa entrevista.

A seguir, o autor mostra como obter um campo de análise e como selecionar as unidades de observação. Não basta saber que tipos de dados deverão ser recolhidos, é também preciso delinear o campo das análises empíricas no espaço, geográfico e social, e no tempo. É preciso levar em conta a margem de manobra do investigador: os prazos e os recursos de que dispõe, os contatos e as informações com que pode contar e suas aptidões. Numa amostra as informações úteis, muitas vezes, só podem ser obtidas junto dos elementos que constituem o conjunto, a totalidade destes elementos chama-se população. Após ter escolhido seu campo de análise o investigador depara-se com três possibilidades: estudar a totalidade da população, estudar uma amostra representativa da população e estudar componentes não estritamente representativas mas características da população.

Existem dois “tipos” de observação: observação direta, o próprio investigador procede diretamente à recolha das informações, sem se dirigir aos sujeitos interessados; observação indireta, o investigador dirige-se ao sujeito para obter a informação desejada, desse modo, o sujeito intervém na informação, sendo essa menos objetiva. Existem três operações da observação: conceber o instrumento de observação, testar o instrumento de observação e a recolha dos dados.

Os principais métodos de recolha de dados são: o inquérito por questionário (colocar a um conjunto de inquiridos uma série de perguntas relativas ao ponto que interesse os investigadores), a entrevista (permitem ao investigador retirar das suas entrevistas informações e elementos de reflexão muito ricos e matizados), a observação direta (método baseado na observação visual, constitui o único método que captam os comportamentos no momento em que eles se reproduzem e em si mesmos, sem a medição de um documento ou de um testemunho) e a recolha de dados preexistentes (estudar os documentos por si próprios ou fazer a análise sociológica de um romance; ou esperar encontrar neles informações úteis para estudar outro objeto); todos esses métodos trazem vantagens e desvantagens, é preciso escolher um que se encaixe com a pesquisa que está sendo desenvolvida.

Fichamento – Pesquisa Qualitativa – ano 2003 (textos 1 e 2)