quinta-feira, 14 de maio de 2009

O Governo Kubitschek: desenvolvimento econômico e estabilidade política - Maria Victoria de Mesquita Benevides

Cap. V
    A política econômico-administrativa do Governo Kubitschek é o fator mais significativo para a convergência dos interesses da aliança PSD/PTB e dos militares e é também fundamental para compreender o período, e pode ser vista como fator de reforço à aliança partidária que sustentava seu governo.
A estabilidade do Governo Kubitschek foi fruto de uma conjuntura especial, na qual militares e Congresso atuaram de maneira convergente, no sentido de permitir e apoiar a política econômica do governo. A principal característica econômica do período é a consolidação da industrialização brasileira.

Três problemas da economia Solução
Déficit no balanço de pagamentos e a deterioração dos termos de troca Aumento das exportações, valorização do café e desenvolvimento industrial.
Os pontos de estrangulamento (interno e externo) Investimentos prioritários em infra-estrutura e recurso ao capital externo contra os pontos de estrangulamento (Programa de Metas)
Inflação Políticas de austeridade nos gastos e redução das despesas supérfluas; seleção rigorosa dos investimentos.

 

A resposta do governo a esses problemas se traduz no planejamento econômico polarizado no Programa de Metas.
    O núcleo da política econômica de Kubitschek constituiu na congregação da iniciativa privada (somada ao capital e a tecnologia estrangeiros) com a intervenção contínua do Estado, como orientador dos investimentos através do planejamento. O governo se torna instrumento do desenvolvimento econômico.
    Política governamental é toda e qualquer tomada de posição do governo visando algum tipo de solução para uma questão socialmente “problematizada”, que, nesse estudo, referem-se todas ao desenvolvimento econômico. O Programa de Metas e as medidas tomadas pelo Executivo para implementa-la são as políticas governamentais mais importantes desse período. O principal objetivo do Programa de Metas era acelerar o processo de acumulação aumentando a produtividade dos investimentos existentes e aplicando novos investimentos em atividades produtoras. O Programa de Metas consistia no planejamento de 31 metas divididas em 6 grupos: energia, transportes, alimentação, indústria de base, educação e construção de Brasília.
    O Programa de Metas e o PTB  para o partido era importante a expansão do parque industrial e da oferta de emprego, a política salarial era favorável ao partido. O PTB foi o maior beneficiário com o Programa de Metas, este se confundia com as metas fundamentais do PTB (objetivos vinculados ao desenvolvimento econômico e social). O desafio do Programa de Metas para o PTB: o partido tinha condições de participar do poder com um programa já organizado e não mais com apelos emocionais. Mas o PTB além de apoiar a implementação da Indústria Automobilística, ele era contra a participação majoritária do capital externo.
A aliança populista (PSD-PTB) não foi diretamente ameaçada por uma política salarial ostensivamente desfavorável, e mesmo a inflação só causou problemas de apoio no final do período.
O Programa de Metas e o PSD  se o PTB recebeu muito, o PSD muito perdeu, pois dependia dos favores locais que não tinham mais “vez” por causa do Programa de Metas. Porém o PSD também tinha interesse no Programa de Metas, pois além de uma oligarquia rural, uma parte do partido era formada por uma burguesia progressista, que se beneficiava com o aumento do parque industrial. E quanto aos interesses rurais, a política de dominação no campo permanece intocável, favorecendo o PSD e outros partidos conservadores (como a UDN). O papel do PSD, quanto à defesa de interesses econômicos, se convertia na luta pelo controle das instituições financeiras do Estado. (“a política financeira do país era a política do PSD”), e também todos os cargos em relação ao Ministério da Fazenda eram ocupados por pessedistas.
PEM  as conseqüências que trazia: restrição do crédito em geral, vital para a indústria tradicional; alta no custo de vida, como um plano inflacionário, afetando diretamente as massas representadas pelo PTB e outros partidos de “esquerda”; o PEM representava um freio ao desenvolvimento econômico e acabaria impedindo a construção de Brasília; por esses motivos os partidos não tinham interesse em apóia-lo. Kubitschek rompe com o PEM quando substitui o ministro da fazenda e o presidente do BNDE.
Em junho de 1959, Kubitschek rompe com o FMI, por causa dos interesses acima, pis o FMI propunha um esquema antiinflacionário de choque e da recusa dos EUA em responder a solicitações da OPA (organização Pan-americana).
A administração paralela era constituída por órgãos já existentes, e eficientes: CACEX, BNDE e SUMOC, somado aos novos órgãos: os Grupos de Trabalho, os Grupos Executivos e o CPA; era um esquema racional, dentro da lógica do sistema, pois os novos órgãos funcionavam como centros de acessória e execução, enquanto que os antigos continuaram a corresponder aos interesses da política de clientela vigente.
A importância de Kubitschek: comprometimento prioritário com o desenvolvimentismo, participação direta na criação (por decreto) dos grupos executivos e outros órgãos administrativos. Criou instrumentos extraconstitucionais (pois a Constituição de 1946 era baseada num sentimento liberalista, e o período era marcado pelo intervencionismo estatal), para obter delegação de poderes para a realização do Programa de Metas. A preponderância do Estado sobre a sociedade civil cresceu à medida que ele se tornava cada vez mais eficiente para controlar a economia através do esquema da administração paralela.
Os Grupos de Trabalho  não tem função executiva, representavam eficientes acessórias que preparavam projetos de lei ou de regulamentação visando, principalmente, maior eficiência na padronização da oferta e manipulação dos incentivos. Seus projetos constituíam eficientes propostas teoricamente apolíticas e apartidárias, mas que serviam como ponte entre o Executivo e o Legislativo e como meio possível para o presidente conseguir apoio para implementar suas metas. Os Grupos de Trabalho já contavam com a concordância dos Grupos Executivos. A eficiência do Programa de Metas pode ser considerada como função da eficiência dos Grupos de Trabalho.
Os Grupos Executivos  foram criados por decreto, como uma nova tentativa de ligar setores públicos e setores privados. Centralizava a ação administrativa, mas descentralizava a execução de suas decisões. Em relação à estabilidade política, sua vantagem era sua autonomia orçamentária e de recrutamento pessoal, garantindo grande flexibilidade operacional.
Além dos Grupos de Trabalho e dos Grupos Executivos, outros órgãos administrativos foram importantes no esquema da administração paralela, porém não foram originais do governo Kubitschek:

  • o conselho do desenvolvimento
  • o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico – BNDE: representou a principal fonte de controle sobre os mecanismos de financiamento do setor público ligados às metas de infra-estrutura.
  • o CPA – Conselho de Política Aduaneira
  • Sudene  caráter eminentemente político.

A grande eficácia da administração paralela: mantinha os privilégios do Poder Executivo e removia os obstáculos para a implementação do Programa de Metas.
O recurso à inflação e ao capital estrangeiro foram alternativas “eficazes” para a promoção do desenvolvimento com estabilidade política.
A Inflação foi a principal fonte de oposição à política econômica do governo, por parte da direita, mas o recurso à inflação garantiu, em partes, o crescimento econômico do país. Foi a alternativa mais viável para financiar o Programa de Metas e a construção de Brasília, já que a reforma tributária seria politicamente impossível, dada à necessidade do governo de conciliar demandas e apoio dentro do sistema político vigente.
O capital estrangeiro foi a principal fonte de oposição à política econômica do governo, por parte da esquerda, mas foi a opção eficaz para a implementação do Programa de Metas. No início a participação do capital norte-americano era quase inexistente.
Do debate sobre o capital estrangeiro vem a questão do papel da ideologia desenvolvimentista, como fonte de apoio difuso e específico ao governo e à sua política econômica. Se o governo Kubitschek era considerado “entreguista” pela “esquerda”, era “nacionalista” em relação à direita reacionária-radical de Lacerda. A ideologia nacionalista não era “difusa” nem muito menos do governo, mas sim a ideologia desenvolvimentista.
ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros  foi habilmente usado pelo Executivo para a propaganda do desenvolvimento e para o fortalecimento do Estado. Embora não tenha patrocinado integralmente a ideologia desenvolvimentista, nunca deixou de dar ampla cobertura ao desenvolvimento capitalista como “única alternativa viável” à superação do subdesenvolvimento brasileiro.

Fichamento de História Social do Brasil – ano 2003

Nenhum comentário: