sábado, 2 de maio de 2009

Fichamento: “Vargas e o Militares: Aprendiz de Feiticeiro” - José Murilo de Carvalho

-    A Era de 1930 a 1964 teve como característica a mudança nas relações entre Vargas e as Forças Armadas
-    A primeira fase, que o autor chamou de namoro (1930 – 1937), teve como principais figuras Vargas e o general Pedro Aurélio Góis Monteiro.
-    Este último era adepto, de início, de que os militares deveriam ficar fora da luta política. Mas em 1930, com as condições do momento mostrando-se propícias (dissidência das oligarquias de MG e RS, com  auxílio das forças públicas estaduais desses Estados) a vitória da Revolução de 1930, que derrubaria o sistema oligárquico vigente, pareceria fácil. E o foi. (E no fim da guerra, pelos rebeldes – a maioria capitães e tenentes “excluídos” do exército – estarem vencendo, até os generais adeptos do presidente Washington Luís penderam para o lado dos rebeldes).
-    Mas muitos tenentes se mantiveram ao lado do governo, e após o fim da guerra, era preciso nomeá-los segundo-tenentes.
-    Desta forma, houve vários desentendimentos dentro do próprio Exército, entre favoráveis dos rebeldes e entre favoráveis do governo; e isso até mesmo após a Revolução de 1930 (também pelos postos ocupados).
-    Aos tenentes juntaram-se as praças, sargentos e cabos que atravessam dificuldades, como: falta de estabilidade, precariedade do sistema do promoção, baixos salários, inexistência de aposentadoria, pensão e outros benefícios sociais.
-    Mas, tinha-se o medo de que o movimento desses contribuíssem para subversão da hierarquia e a fragmentação da organização (Militar).
-    Além disso, esses oficiais-generais aspiravam por maiores benefícios (promoções, comissões, postos de prestígio). Assim, muitos generais (quase todos os mais importantes) estavam envolvidos até mesmo para obter a presidência da República (e Góis Monteiro seria o candidato em oposição a Vargas).
-    A desunião dos militares beneficiou Vargas, que queria uma força armada capaz de conter os excessos das novas lideranças oligárquicas e civis, mas que não o ameaçasse (fortalecia a organização militar mas controlava seus chefes).
-    Assim conseguiu permanecer no governo tanto na sucessão de 1934, nas revoltas de 1935 e no golpe de 1937.
-    Vargas promoveu Góis Monteiro desde 1930; e em 1932 este último era general-de-divisão (posto mais alto na época). Mas ao mesmo tempo, Vargas era o grande mediador dos conflitos militares, e por isso, Góis nunca conseguiu impor-se ao presidente a ponto de derrubá-lo. Somente em 1945, quando Góis e aliados se sentiram fortalecidos, é que encorajaram-se para enfrentar o presidente.
-    A idéia de Góis era fortalecer o Exército e acabar com as rebeliões internas. Havia dois tipos de conflitos: entre praças e oficiais, e entre oficiais.
-    O primeiro dividiu Exército e Marinha (os praças tinham desvantagem com relação aos oficiais).
-    O segundo tinha natureza ideológica e política; e dividiu-se em três modelos: 1º) com a hegemonia burguesa, o Exército deveria dedicar à defesa externas (posição de Góis antes de 1930); 2º) os oficiais deveriam intervir nas políticas internas; e desejavam também o fortalecimento do Exército (federação das forças públicas estaduais, defesa de um papel de liderança para a elite militar); 3º) a influência do PCB (Partido Comunista do Brasil) que propunha um Exército popular (este “assustava” tanto as elites civis como os oficiais).
-    Mas no momento a 1º e a 3º concepção eram irreais. E com isso a maioria dos militares aderiram ao intervencionismo (inclusive Góis).
-    Os intervencionistas reformistas, para implementar as reformas, precisavam controlar a organização, mas para isso, iriam ferir a hierarquia do Exército. Para contê-los Góis interveio (a ponto de tornar vitorioso o Golpe de 1937), e segundo  ele: o Estado predominaria a vida política nacional com a necessidade de apoio de elites bem treinadas e capazes (estas últimas, logicamente, seriam para ele o Exército).
-    E para haver a política do Exército era preciso eliminar os conflitos internos, fortalecer a hierarquia e incrementar a organização com arrmamentos e treinamento.
-    A primeira mudança, apoiada por Vargas que desejava um aliado sólido e forte, foi a obrigatoriedade do serviço militar para todos.
-    Os tiros de guerra foram reativados (para treinar os civis e para imbuí-los de valores militares).
-    Além disso, houve o treinamento de oficiais da reserva nos centros e núcleos de Preparação de \oficiais da Reserva (que faziam com que aqueles que não estavam no serviço obrigatório também treinassem).
-    E procurou-se dificultar a promoção de sargentos ao oficialato com o objetivo de eliminar os conflitos gerados pela situação das praças. Mas esse problema voltou em fins da Era Vargas e foi fator importante na crise de 1964.
-    E também priorizou-se o recrutamento e treinamento de oficiais (que  seriam os reais profissionais). Os candidatos às escolas militares (como a Academia Militar) eram discriminados por raça, cor, religião, família e ideologia. Estes, dentro das escolas, passavam por um intenso processo de doutrinação (treinamento ideológico).
-    A participação dos militares, dessa forma, deveria ser via corporação e a participação política individual dos militares foi combatida; e a obediência aos superiores deveria ser incondicional.
-    Mas para conseguir implementar todas essas mudanças era preciso substituir nos altos postos do Exército o antigo regime pelo novo. Três momentos foram importantes para isso: na Revolução de 1932 (que Góis foi vitorioso) muitos dos oficiais hostis a nova ordem foram exilados e reformados e os oficiais “do novo regime” promovidos; e nas revoltas comunistas (Natal, Recife e Rio de Janeiro) no qual oficiais e praças foram expulsos, além de presos, transferidos, advertidos etc ; e a reação do governo ao integralismo em 1937 e 1938, cujos oficiais integralistas também foram punidos.
-    Vê-se então que a partir de 1932, formara-se um novo Exército e cujo poder se consolidou com o golpe de 1937. Este grupo (1937-1945) era comandado por Góis de Monteiro e Eurico Gaspar Dutra (que renunciou em 1945 para disputar a presidência da República).
-    Vargas percebe o caráter complementar  destes dois generais e tenta, de certa forma, comandá-los, para mantê-los sob controle.
-    Esse foi o relacionamento de Vargas com as Forças Armadas de 1930-1937: apoio mútuo.
-    A segunda fase das relações o autor chama de lua-de-mel (1937-1945)
-    Em 1937, com o apoio da Forças Armadas, Vargas fecha o Congresso, outorga nova Constituição e estabelece uma ditadura (Estado Novo). Para entender isso, é preciso compreender o desenrolar desde 1930.
-    1930 havia uma preocupação dos civis com uma aliança com os militares.
-    As forças Armadas tinham interesses que diferiam dos das elites civis, tais como: mudanças no regime político no sentido de maior centralização, menor poder para as oligarquias regionais, controle das Forças Armadas sobre as polícias militares estaduais, maior intervenção do Estado na economia.
-    Além disso, tanto os militares como os civis estavam divididos em seus grupos ( as divisões das elites civis foram principalmente nas cisões intra-oligárquicas).
-    O primeiro embate entre elas mostrou que o governo central não tinham grande número de bases civis de apoio e precisava acabar com o crescimento dos reformistas; para as Forças Armadas permitiu-se expulsar os opositores e aumentar efetivos de guerra e verbas orçamentárias; as elites políticas perceberam que não poderiam voltar ao federalismo e sua divisão fortalecera o governo central.
-    O segundo embate aconteceu em l935, devido em partes à Constituição de l934, pois cresceu a mobilização política liberada pela Aliança Nacional Libertadora  (que era apoiada pelo Exército) e pela Ação Integralista Brasileira  (que era apoiada pela Marinha). O Exército concordava com a AIB mas não gostava de seu lado mobilizador do integralismo.
-    Dessa forma, o embate foi muito reprimido pelo governo e houve punições dentro do Exército.
-    As elites civis com medo da revolução apoiaram, a contragosto, o fortalecimento do poder dos militares.
-    E a campanha eleitoral de l937 pôs fim aos embates, pois o candidato José Américo de Almeida tinha um discurso populista que desagradava tanto o governo como as Forças Armadas que reagiram de forma manipuladora; e em l937, o candidato renunciou, (sendo definitivamente o fim da Primeira República). Em seguida veio o golpe (e, como em países da Europa, a ditadura estabeleceu-se sob a tutela das Forças Armadas).
-    Agora as Forças Armadas não tinham mais uma concepção de postura neutra, mas a ideologia do intervencionismo tutelar apresentava o Exército como parte do Estado e como instrumento de sua política.
-    O plano de reformas do novo regime punha ênfase nas defesas interna e externa, no fortalecimento das Forças Armadas, no desenvolvimento econômico, na promoção das indústrias de base e na exportação. Por trás deste autoritarismo do regime, havia um projeto de desenvolvimento nacional sob a liderança do Estado com apoio das Forças Armadas.
-    Vargas deu total apoio, renovado em l937, que redundara em grande expansão da organização militar, principalmente do Exército. E em l937, as polícias militares foram submetidas ao controle das Forças Armadas.
-    O orçamento militar aumentou nesta época (devido a República Paulista em l932, ao acordo de Vargas com as Forças Armadas em l937).
-    No Estado Novo, o governo Vargas detinha apoio dos oficiais, mesmo quando estes não concordavam com suas idéias.
-    Com o acordo entorno do Estado Novo, Vargas e as Forças Armadas atingiram o9 ponto máximo de sua influência, derrotando os adversários e eliminando sua capacidade de reação pelo fechamento dos mecanismos de participação.
-    A terceira fase, foi chamada pelo autor de divórcio (l945 – l964).
-    Vargas sempre preocupou-se com a política entre o governo e os sindicatos, principalmente nos fins do Estado Novo.
-    Vargas de acordo com a legislação sindical e social que criara, passou a dirigir-se aos sindicatos e à classe operária pois via a necessidade de pôr fim à ditadura e contar com um novo ato político  com peso eleitoral; e com isso foi construindo-se a imagem de Vargas como “o  pai dos pobres, o amigo dos operários”.
-    Só que as Forças Armadas , melhor a facção que as dominava, já então tomadas pelo anticomunismo e pela pretensão de guiar o Estado, não aceitaram a busca de novo ator político que lhe era política e ideologicamente antagônico.
-    Contra Vargas ficaram os principais entre seus antigos auxiliares, como Góis, Dutra, Canrobet Pereira da Costa. Ao seu lado, poucos generais e alguns oficiais que haviam participado da Força Expedicionária Brasileira na Itália.
-    Muitas foram as pressões sobre os militares para acabar com a ditadura (de democratas, liberais e reacionários). E o receio de que Vargas tentasse permanecer no poder( acabando com o processo eleitoral que estava em andamento, levara à sua deposição pelas Forças Armadas em l945. Foi a primeira vez que as três armas agiram em conjunto.
-    O general Dutra governou até l950.
-    Mas em l950 Vargas volta, eleito, ao poder. No entanto, como muito observadores disseram, Vargas voltou ao poder sem acuidade e vontade de poder: calculou mal sua influência dentro das Forças Armadas, pois muitos de seus antigos aliados agora eram  seus inimigos.
-    A luta começou em l950 quando clube militar demostrou não se interessar, e até mesmo ser contra, o envio de tropas brasileiras para a Guerra na Coréia.
-    E nos fins de l952, as bases militares de Vargas estavam quase completamente destroçadas.
-     Mas em 1954 foi publicado o memorial dos Coronéis, que demonstrava as precariedades do Exército; mas na verdade a finalidade era atingir João Goulart (que como ministro do Trabalho aumentara o salário mínimo em 100%). O Memorial pretendia incentivar os generais para uma ação anti-Vargas.
-    Mas com a morte de Rubens Vaz, protetor de Carlos Lacerda, as agitações se intensificaram e alguns generais pediam a renuncia de Vargas. Vendo-se “sem saída” Vargas suicidou-se em 24 de agosto de 1954.
-    Os militares (que venceram em 1945) venceram novamente.
-    A candidatura de  Juscelino Kubitschek, lançada pelo Partido Social Democrático (PSD), reacendeu o udenismo militar. Os mesmos que combatiam Vargas passaram a combater Juscelino.
-    A vitória deveu-se mais ao apoio popular a Juscelino. Para as Forças Armadas, o 11 de novembro foi traumático. Dividiu o Exército internamente, além de imcompatibilizá-lo com a Marinha e a Aeronáutica.
-    Em 1961 João Goulart sob ao poder, após a renúncia de Jânio Quadros (eleito em 1960).
-    Houve dois movimentos de sargentos em 1963, que apesar de fracassados, causaram pânico nos oficiais.
-    Em 30 de março de 1963, o presidente João Goulart compareceu a festa de sargentos quando pronunciou um discurso inflamado. Foi o que bastou para sdesencadear, em 31 de março, o movimento golpista de militares e políticos, que rapidamente se tornou vitorioso.
-    Mas como as Forças Armadas estavam divididas mesmo com o golpe de 64, houve muitas punições, com expurgos.
-    Com o golpe houve a tentativa de unir novamente as Forças Armadas e de controlar a hierarquia e ideologia dentro desta
-    O “Feitiço voltou-se contra o Feiticeiro” pois Vargas aliou-se aos militares anteriormente, mas foi derrubado por estes também. E uma das causas principais de sua queda – da oposição dos militares – foi o seu apoio e aliança com os setores populares.

Fichamento de História Social do Brasil, ano 2003

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