Cap. V
A política econômico-administrativa do Governo Kubitschek é o fator mais significativo para a convergência dos interesses da aliança PSD/PTB e dos militares e é também fundamental para compreender o período, e pode ser vista como fator de reforço à aliança partidária que sustentava seu governo.
A estabilidade do Governo Kubitschek foi fruto de uma conjuntura especial, na qual militares e Congresso atuaram de maneira convergente, no sentido de permitir e apoiar a política econômica do governo. A principal característica econômica do período é a consolidação da industrialização brasileira.
Três problemas da economia | Solução |
Déficit no balanço de pagamentos e a deterioração dos termos de troca | Aumento das exportações, valorização do café e desenvolvimento industrial. |
Os pontos de estrangulamento (interno e externo) | Investimentos prioritários em infra-estrutura e recurso ao capital externo contra os pontos de estrangulamento (Programa de Metas) |
Inflação | Políticas de austeridade nos gastos e redução das despesas supérfluas; seleção rigorosa dos investimentos. |
A resposta do governo a esses problemas se traduz no planejamento econômico polarizado no Programa de Metas.
O núcleo da política econômica de Kubitschek constituiu na congregação da iniciativa privada (somada ao capital e a tecnologia estrangeiros) com a intervenção contínua do Estado, como orientador dos investimentos através do planejamento. O governo se torna instrumento do desenvolvimento econômico.
Política governamental é toda e qualquer tomada de posição do governo visando algum tipo de solução para uma questão socialmente “problematizada”, que, nesse estudo, referem-se todas ao desenvolvimento econômico. O Programa de Metas e as medidas tomadas pelo Executivo para implementa-la são as políticas governamentais mais importantes desse período. O principal objetivo do Programa de Metas era acelerar o processo de acumulação aumentando a produtividade dos investimentos existentes e aplicando novos investimentos em atividades produtoras. O Programa de Metas consistia no planejamento de 31 metas divididas em 6 grupos: energia, transportes, alimentação, indústria de base, educação e construção de Brasília.
O Programa de Metas e o PTB para o partido era importante a expansão do parque industrial e da oferta de emprego, a política salarial era favorável ao partido. O PTB foi o maior beneficiário com o Programa de Metas, este se confundia com as metas fundamentais do PTB (objetivos vinculados ao desenvolvimento econômico e social). O desafio do Programa de Metas para o PTB: o partido tinha condições de participar do poder com um programa já organizado e não mais com apelos emocionais. Mas o PTB além de apoiar a implementação da Indústria Automobilística, ele era contra a participação majoritária do capital externo.
A aliança populista (PSD-PTB) não foi diretamente ameaçada por uma política salarial ostensivamente desfavorável, e mesmo a inflação só causou problemas de apoio no final do período.
O Programa de Metas e o PSD se o PTB recebeu muito, o PSD muito perdeu, pois dependia dos favores locais que não tinham mais “vez” por causa do Programa de Metas. Porém o PSD também tinha interesse no Programa de Metas, pois além de uma oligarquia rural, uma parte do partido era formada por uma burguesia progressista, que se beneficiava com o aumento do parque industrial. E quanto aos interesses rurais, a política de dominação no campo permanece intocável, favorecendo o PSD e outros partidos conservadores (como a UDN). O papel do PSD, quanto à defesa de interesses econômicos, se convertia na luta pelo controle das instituições financeiras do Estado. (“a política financeira do país era a política do PSD”), e também todos os cargos em relação ao Ministério da Fazenda eram ocupados por pessedistas.
PEM as conseqüências que trazia: restrição do crédito em geral, vital para a indústria tradicional; alta no custo de vida, como um plano inflacionário, afetando diretamente as massas representadas pelo PTB e outros partidos de “esquerda”; o PEM representava um freio ao desenvolvimento econômico e acabaria impedindo a construção de Brasília; por esses motivos os partidos não tinham interesse em apóia-lo. Kubitschek rompe com o PEM quando substitui o ministro da fazenda e o presidente do BNDE.
Em junho de 1959, Kubitschek rompe com o FMI, por causa dos interesses acima, pis o FMI propunha um esquema antiinflacionário de choque e da recusa dos EUA em responder a solicitações da OPA (organização Pan-americana).
A administração paralela era constituída por órgãos já existentes, e eficientes: CACEX, BNDE e SUMOC, somado aos novos órgãos: os Grupos de Trabalho, os Grupos Executivos e o CPA; era um esquema racional, dentro da lógica do sistema, pois os novos órgãos funcionavam como centros de acessória e execução, enquanto que os antigos continuaram a corresponder aos interesses da política de clientela vigente.
A importância de Kubitschek: comprometimento prioritário com o desenvolvimentismo, participação direta na criação (por decreto) dos grupos executivos e outros órgãos administrativos. Criou instrumentos extraconstitucionais (pois a Constituição de 1946 era baseada num sentimento liberalista, e o período era marcado pelo intervencionismo estatal), para obter delegação de poderes para a realização do Programa de Metas. A preponderância do Estado sobre a sociedade civil cresceu à medida que ele se tornava cada vez mais eficiente para controlar a economia através do esquema da administração paralela.
Os Grupos de Trabalho não tem função executiva, representavam eficientes acessórias que preparavam projetos de lei ou de regulamentação visando, principalmente, maior eficiência na padronização da oferta e manipulação dos incentivos. Seus projetos constituíam eficientes propostas teoricamente apolíticas e apartidárias, mas que serviam como ponte entre o Executivo e o Legislativo e como meio possível para o presidente conseguir apoio para implementar suas metas. Os Grupos de Trabalho já contavam com a concordância dos Grupos Executivos. A eficiência do Programa de Metas pode ser considerada como função da eficiência dos Grupos de Trabalho.
Os Grupos Executivos foram criados por decreto, como uma nova tentativa de ligar setores públicos e setores privados. Centralizava a ação administrativa, mas descentralizava a execução de suas decisões. Em relação à estabilidade política, sua vantagem era sua autonomia orçamentária e de recrutamento pessoal, garantindo grande flexibilidade operacional.
Além dos Grupos de Trabalho e dos Grupos Executivos, outros órgãos administrativos foram importantes no esquema da administração paralela, porém não foram originais do governo Kubitschek:
- o conselho do desenvolvimento
- o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico – BNDE: representou a principal fonte de controle sobre os mecanismos de financiamento do setor público ligados às metas de infra-estrutura.
- o CPA – Conselho de Política Aduaneira
- Sudene caráter eminentemente político.
A grande eficácia da administração paralela: mantinha os privilégios do Poder Executivo e removia os obstáculos para a implementação do Programa de Metas.
O recurso à inflação e ao capital estrangeiro foram alternativas “eficazes” para a promoção do desenvolvimento com estabilidade política.
A Inflação foi a principal fonte de oposição à política econômica do governo, por parte da direita, mas o recurso à inflação garantiu, em partes, o crescimento econômico do país. Foi a alternativa mais viável para financiar o Programa de Metas e a construção de Brasília, já que a reforma tributária seria politicamente impossível, dada à necessidade do governo de conciliar demandas e apoio dentro do sistema político vigente.
O capital estrangeiro foi a principal fonte de oposição à política econômica do governo, por parte da esquerda, mas foi a opção eficaz para a implementação do Programa de Metas. No início a participação do capital norte-americano era quase inexistente.
Do debate sobre o capital estrangeiro vem a questão do papel da ideologia desenvolvimentista, como fonte de apoio difuso e específico ao governo e à sua política econômica. Se o governo Kubitschek era considerado “entreguista” pela “esquerda”, era “nacionalista” em relação à direita reacionária-radical de Lacerda. A ideologia nacionalista não era “difusa” nem muito menos do governo, mas sim a ideologia desenvolvimentista.
ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros foi habilmente usado pelo Executivo para a propaganda do desenvolvimento e para o fortalecimento do Estado. Embora não tenha patrocinado integralmente a ideologia desenvolvimentista, nunca deixou de dar ampla cobertura ao desenvolvimento capitalista como “única alternativa viável” à superação do subdesenvolvimento brasileiro.
Fichamento de História Social do Brasil – ano 2003
Nenhum comentário:
Postar um comentário